terça-feira, 6 de julho de 2010

CONDORCET

A idéia de leis naturais da vida social e de uma ciência da sociedade formada segundo o modelo das ciências da natureza é, na sua origem, inseparável do combate intelectual do Terceiro Estado contra a ordem feudal-absolutista. Tanto a doutrina do direito natural quanto a de uma ciência natural da sociedade possuem uma dimensão utópico-revolucionária, crítica (as duas estão estreitamente, aliás, ligadas ao século XVIII). O positivismo moderno nasceu como um legítimo descendente da filosofia do Iluminismo. De todos os Enciclopedistas, é, sem dúvida, Condorcet quem contribuiu da maneira mais direta e imediata na gênese da nova corrente.

Próximo dos fisiocratas (especialmente Turgot) e dos clássicos ingleses (A. Smith), Condorcet pensa que a economia política pode estar submetida à "precisão do cálculo" e ao método das ciências da natureza. Mas não se limita aos fatos econômicos e passa a generalizar esta démarche: o conjunto dos fenômenos sociais está submetido "às leis gerais... necessárias e constantes" parecidas com as que regem as operações de natureza. Daí, a idéia de uma ciência natural da sociedade ou de uma "matemática social" baseada no cálculo das probabilidades. O estudo dos fatos sociais foi, por muito tempo, "abandonado ao acaso, à avidez dos governos, à astúcia dos charlatães, aos preconceitos ou aos interesses de todas as classes poderosas"; aplicando o novo método à moral, a política e à economia pública, pode-se "seguir nas ciências um caminho quase tão seguro quanto o das ciências naturais". Aliás, as ciências da sociedade procuram incessantemente aproximar-se deste "caminho das ciências físicas que o interesse e as paixões não vêm perturbar".

Este ideal de ciência neutra, tão imune aos "interesses e paixões", quanto a física ou a matemática, estará no coração da problemática positivista durante dois séculos. Mas, há ainda em Condorcet uma significação utópico-crítica: seu objetivo confesso é o de emancipar o conhecimento social dos "interesses e paixões" das classes dominantes. O cienticismo positivista é aqui um instrumento de luta contra o obscurantismo clerical, as doutrinas teológicas, os argumentos de autoridade, os axiomas a priori da Igreja, os dogmas imutáveis da doutrina social e política feudal. É neste sentido que é preciso compreender o apelo ao modelo científico-natural em Condorcet: "Galileu... fundou, para as ciências a primeira escola onde elas eram cultivadas sem nenhuma mistura de superstição, seja em relação aos preconceitos, seja em relação à autoridade: onde se rejeitou com uma severidade filosófica qualquer outro meio que não fosse o da experiência ou do cálculo". Contudo, Condorcet censura Galileu por limitar-se "exclusivamente às ciências físicas e matemáticas"; trata-se agora de ampliar esta atitude - apoiando-se no método de Bacon e de Descartes - para as ciências econômicas e políticas. O combate à ciência social livre de "paixões" é, portanto, inseparável da luta revolucionária dos Enciclopedistas e de toda a filosofia do Iluminismo contra os preconceitos, isto é, contra toda a ideologia tradicionalista (principalmente clerical) do Antigo Regime.

Acha-se em O esboço de um quadro histórico dos progressos do espírito humano a intuição de que o desenvolvimento no terreno dos fatos sociais choca-se com os interesses de classe: "quanto mais os objetos submetidos à razão tocarem os interesses religiosos e políticos, tanto mais lentos os progressos do espírito jumano"; mas, trata-se, para Condorcet, de um fenômeno do passado relacionado com os interesses clericais ou aristocráticos. A possibilidade de que a nova ciência econômica e política, representada pelos fisiocratas, A. Smith e pelos próprios Enciclopedistas, esta ciência racional, precisa e experimental pudesse estar, ela também, ligada a interesses sociais, escapa ao campo de visibilidade de Condorcet e dos positivistas em geral.




BIBLIOGRAFIA
CONDORCET. Bosquejo de un cuadro historico de los progresos del espiritu humano y otros textos. Ciudad del Mexico: Ed. Fondo de Cultura Economica, 2008.

Um comentário:

Anônimo disse...

valeu me slavou na facul