"O homem é tão bem manipulado e ideologizado que até mesmo o seu lazer se torna uma extensão do trabalho." Theodor W. Adorno
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
"CHEGUEI A ESTAR MORTO, MAS RESSUSCITEI"
Em entrevista exclusiva ao jornal mexicano La Jornada (a primeira concedida a um veículo impresso desde que uma diverticulite obrigou seu afastamento da liderança do governo cubano), Fidel Castro fala sobre o que aconteceu, diz que esteve à beira da morte, mas ressuscitou. E fala de seus planos para o futuro: "Não quero estar ausente nestes dias. O mundo está na fase mais interessante e perigosa de sua existência e eu estou bastante comprometido com o que está acontecendo. Ainda tenho muitas coisas para fazer".
Continua na Agência Carta Maior.
sábado, 28 de agosto de 2010
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
VIOLÊNCIA NOS EUA E NO BRASIL
Cuba, Brasil e a China são países mais pacíficos que os Estados Unidos, de acordo com um relatório publicado hoje. O índice global da paz, elaborado pelo Instituto para a Economia e a Paz (IEP, na sigla em inglês), sediado em Sydney, na Austrália, diz que o mundo em geral está virando um lugar mais violento. O relatório diz que quase dois terços dos 149 países, classificados todos os anos, ficaram lugares mais violentos desde 2007.
O Iraque é o país mais violento no mundo (149º lugar), diz o relatório, seguido pela Somália, Afeganistão, Sudão, Paquistão, Israel, Geórgia, Chade e República Democrática do Congo. Os países mais pacíficos são a Nova Zelândia, que está em primeiro na lista, Islândia, Japão, Áustria, Noruega, Irlanda, Dinamarca, Luxemburgo, Finlândia e Suécia.
Os EUA estão em 85º lugar, abaixo de Cuba (72º lugar), da Argentina (71º), do Brasil (83º) e da China (80º) e apenas uma classificação acima de Angola (86º lugar). O Brasil ficou com sua posição inalterada em comparação a 2009.
"Sugerindo a possibilidade de que o rápido desenvolvimento possa ter trazido mais conflitos na sua esteira, o IEP também notou que três países dos BRICS - Rússia (143º lugar), China (80º lugar) e Índia (128º lugar), assistiram a um declínio substancial na tranquilidade", diz um trecho do relatório.
O ranking lista 149 países. A Turquia ficou em 126º lugar, a Itália em 40º, a França em 32º e o Reino Unido em 31º.
A ideia de criar o índice foi de Steve Kilelea, um empreendedor australiano que queria identificar o que faz um país ser pacífico e tranquilo. Ele pediu à Unidade de Inteligência da Economist, afiliada à revista The Economist, que pesquisasse uma série de variáveis, do nível de homicídios por 100 mil habitantes - dado que prejudicou os EUA e favoreceu a Dinamarca - à corrupção e ao acesso à educação primária. A pesquisa também leva em conta níveis de criminalidade, número de pessoas na prisão em proporção à população total de um país, gastos militares e existência ou não de tumultos sociais.
Fonte: A Tarde
O Iraque é o país mais violento no mundo (149º lugar), diz o relatório, seguido pela Somália, Afeganistão, Sudão, Paquistão, Israel, Geórgia, Chade e República Democrática do Congo. Os países mais pacíficos são a Nova Zelândia, que está em primeiro na lista, Islândia, Japão, Áustria, Noruega, Irlanda, Dinamarca, Luxemburgo, Finlândia e Suécia.
Os EUA estão em 85º lugar, abaixo de Cuba (72º lugar), da Argentina (71º), do Brasil (83º) e da China (80º) e apenas uma classificação acima de Angola (86º lugar). O Brasil ficou com sua posição inalterada em comparação a 2009.
"Sugerindo a possibilidade de que o rápido desenvolvimento possa ter trazido mais conflitos na sua esteira, o IEP também notou que três países dos BRICS - Rússia (143º lugar), China (80º lugar) e Índia (128º lugar), assistiram a um declínio substancial na tranquilidade", diz um trecho do relatório.
O ranking lista 149 países. A Turquia ficou em 126º lugar, a Itália em 40º, a França em 32º e o Reino Unido em 31º.
A ideia de criar o índice foi de Steve Kilelea, um empreendedor australiano que queria identificar o que faz um país ser pacífico e tranquilo. Ele pediu à Unidade de Inteligência da Economist, afiliada à revista The Economist, que pesquisasse uma série de variáveis, do nível de homicídios por 100 mil habitantes - dado que prejudicou os EUA e favoreceu a Dinamarca - à corrupção e ao acesso à educação primária. A pesquisa também leva em conta níveis de criminalidade, número de pessoas na prisão em proporção à população total de um país, gastos militares e existência ou não de tumultos sociais.
Fonte: A Tarde
terça-feira, 24 de agosto de 2010
ABORTO
O aborto é uma questão política grave no Brasil. Ser contra esse procedimento é um direito, assim como é direito considerar que, no processo de educação das crianças para a vida, "um tapinha não dói" - cerne de outra polêmica recente e que pôs em lados opostos cientistas das mais diversas áreas de Humanas e a grande imprensa.
Antes de entrar no mérito da questão quero lembrar que nós, seres humanos, não somos "tábuas rasas". Não somos coisas. Ser humano é ser o complexo resultado de múltiplas interações cuja forma de influência na personalidade nem sempre é clara em um debate.
É necessário considerar indivíduos como coisas para achar que nossos conceitos não têm pressupostos, isto é, não se ligam a idéias anteriores e que defendemos com unhas e dentes, inclusive de forma inconsciente. Esses conceitos não são defendidos pelo que são, mas pelos significados com os quais foram inscritos em nossas mentes ao longo da vida.
Ao processo segundo o qual idéias são transformadas em conceitos ou "valores da natureza humana" sem o devido lastro que lhe dá suporte a Sociologia chama "ideologia".
O aborto é uma fonte perene de produção de ideologias. O argumento de que a sua descriminalização levará aos hospitais uma miríade de adolescentes tem como ponto de partida uma certa relativização da responsabilidade da mulher sobre o seu próprio corpo. Trata-se aí da ideologia arrevesada de que a mulher não pode, por natureza, escolher racionalmente o melhor para a sua própria saúde física. Deve, portanto, ter sua natureza maligna limitada por aparatos jurídicos.
Em consequencia de tal pressuposto, defende-se indiretamente a idéia de que tais cirurgias continuem sendo feitas em clínicas de "fundo de quintal", por profissionais não-qualificados e sem qualquer garantia em caso de agravamento do quadro médico.
Ser contra o aborto é um direito, mas é também uma questão de fé: é necessário ser adepto da tese da "natureza caída" e da "preexistência da alma", dentre outras, para apresentar tais contribuições a um debate.
A descriminalização do aborto, ao contrário, é uma questão de saúde pública. A mulher precisa poder dirigir o seu próprio corpo e decidir quando e se poderá abortar. O velho conceito filosófico de imperativo ético do indivíduo para a vida boa, plena e feliz, precisa definitivamente chegar às mulheres...
Isso não é justo?
A despeito de toda a sorte de mitologias e correntes pela internet, não há provas científicas de que a "alma humana" começa no útero. Aliás, o próprio conceito de alma, nascido da filosofia grega por meio de Platão e tomado de empréstimo pela mitologia judaico-cristã, tornou-se norma cultural às custas de muito sangue, suor e fogo, especialmente ao longo dos últimos 2 mil anos.
Graças a essa pressão, conquistada na ponta da espada, nosso marco jurídico considera o tutelamento de todo um gênero sexual algo correto e até poético. Que o faça. No entanto, vale ressaltar que nem isso dá a uma crença religiosa, metafísica, o direito de tornar-se um valor compulsório da vida democrática.
A menos, é claro, que a democracia representativa seja uma falsificação.
Antes de entrar no mérito da questão quero lembrar que nós, seres humanos, não somos "tábuas rasas". Não somos coisas. Ser humano é ser o complexo resultado de múltiplas interações cuja forma de influência na personalidade nem sempre é clara em um debate.
É necessário considerar indivíduos como coisas para achar que nossos conceitos não têm pressupostos, isto é, não se ligam a idéias anteriores e que defendemos com unhas e dentes, inclusive de forma inconsciente. Esses conceitos não são defendidos pelo que são, mas pelos significados com os quais foram inscritos em nossas mentes ao longo da vida.
Ao processo segundo o qual idéias são transformadas em conceitos ou "valores da natureza humana" sem o devido lastro que lhe dá suporte a Sociologia chama "ideologia".
O aborto é uma fonte perene de produção de ideologias. O argumento de que a sua descriminalização levará aos hospitais uma miríade de adolescentes tem como ponto de partida uma certa relativização da responsabilidade da mulher sobre o seu próprio corpo. Trata-se aí da ideologia arrevesada de que a mulher não pode, por natureza, escolher racionalmente o melhor para a sua própria saúde física. Deve, portanto, ter sua natureza maligna limitada por aparatos jurídicos.
Em consequencia de tal pressuposto, defende-se indiretamente a idéia de que tais cirurgias continuem sendo feitas em clínicas de "fundo de quintal", por profissionais não-qualificados e sem qualquer garantia em caso de agravamento do quadro médico.
Ser contra o aborto é um direito, mas é também uma questão de fé: é necessário ser adepto da tese da "natureza caída" e da "preexistência da alma", dentre outras, para apresentar tais contribuições a um debate.
A descriminalização do aborto, ao contrário, é uma questão de saúde pública. A mulher precisa poder dirigir o seu próprio corpo e decidir quando e se poderá abortar. O velho conceito filosófico de imperativo ético do indivíduo para a vida boa, plena e feliz, precisa definitivamente chegar às mulheres...
Isso não é justo?
A despeito de toda a sorte de mitologias e correntes pela internet, não há provas científicas de que a "alma humana" começa no útero. Aliás, o próprio conceito de alma, nascido da filosofia grega por meio de Platão e tomado de empréstimo pela mitologia judaico-cristã, tornou-se norma cultural às custas de muito sangue, suor e fogo, especialmente ao longo dos últimos 2 mil anos.
Graças a essa pressão, conquistada na ponta da espada, nosso marco jurídico considera o tutelamento de todo um gênero sexual algo correto e até poético. Que o faça. No entanto, vale ressaltar que nem isso dá a uma crença religiosa, metafísica, o direito de tornar-se um valor compulsório da vida democrática.
A menos, é claro, que a democracia representativa seja uma falsificação.
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
O VERDE É CONSERVADOR?
Marina Silva se tornou uma política conservadora, que facilmente pode ser incorporada no discurso religioso de salvacionismo do planeta, com o qual ela está afinada. As suas idéias encontram uma pirâmide consistente de valores: Deus, Ambiente e Sociedade. Ela é a primeira do novo cristianismo brasileiro a parecer viver pela idéia que considera verdadeira. Com capacidade, inclusive, de conquistar os conservadores brasileiros - aqueles que não possuem um projeto de poder deliberado, mas que aceitam a vida tal como ela é. O projeto ambiental no Brasil é um projeto por acontecer. E não virá do PV, que deve ser implodido como casa de um pobre conservadorismo sem poder.
Continua na Agência Carta Maior.
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sexta-feira, 20 de agosto de 2010
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
SONHOS COM A LÍNGUA PORTUGUESA
As posições dominantes em uma sociedade são contraditórias, como os sonhos. Nutrem-se ao mesmo tempo de verdades profundas e de ignorâncias, de bom senso e preconceitos. Às vezes estas posições vêm imbuídas de bons valores iluministas, em prol de um olhar mais racional e totalizante, superando velhos hábitos cristalizados na cultura e portando projetos de futuro. Outras vezes, trazem os nobres valores do romantismo, com palavras de luta, resgate e defesa do que somos e pelo que somos.
Abaixo, duas intervenções públicas em defesa da língua portuguesa, a de um publicitário e a de um político. O quanto elas são diferentes? Onde elas convergem?
Na terça-feira (27/7), Nizan Guanaes, famoso publicitário e presidente do grupo ABC de marketing – o 20º maior do mundo –, publicou no caderno "Mercado", da Folha de S.Paulo, um curioso artigo intitulado "Vamos falar português". Com uma incrível e saudável crueza, disse o que muitos gramáticos e estudiosos da língua titubeiam em afirmar: "Está provado: a força da língua está ligada à força da economia." É para nenhum materialista botar defeito!
O texto de Nizan reflete sobre um passado em que "nossa maneira de desqualificar as pessoas era dizer: ele só fala português". Já aí temos uma mostra da maravilha que é o universo da língua, o baú de contradições e conflitos que ela trabalha: no uso desse pronome possessivo na primeira pessoa do plural (em "nossa maneira"), pretensamente inclusivo, não nos incluímos eu e milhões de brasileiros que jamais falaríamos um disparate como esse para desqualificar alguém. Não esqueçamos, entretanto, o veículo e o caderno (o público) para o qual foi escrito "Vamos falar português".
No Brasil de hoje, segue o articulista, os números da economia finalmente são bons e o país encontrou o seu desenho político, fazendo com que tenhamos "tempo, foco e motivação para cuidar das palavras". Nizan, considerado um dos embaixadores do Brasil no cenário internacional dos negócios, defende que se espalhe o português pelo mundo e diz que nessa notável missão podemos contar também com Angola e Moçambique, que devem crescer os mesmos 6% ou 7% que o Brasil em 2010.
Continua no Observatório da Imprensa.
terça-feira, 17 de agosto de 2010
O PASSADO E O PRESENTE DA IMPRENSA BRASILEIRA
A revista Época fez o que se espera da Globo, um dos pilares de sustentação da ditadura militar: resgatou a agenda da Guerra Fria e destacou na capa o “passado de Dilma”. O ovo da serpente permanece presente na sociedade brasileira. O que deveria ser tema de orgulho para uma sociedade democrática é apresentado por uma das principais revistas do país com ares de suspeita. Os editores de Época honram assim o passado autoritário e anti-democrático de sua empresa e nos mostram que ele está vivo e atuante. No RS, jornal Zero Hora aplaude suspensão de indenizações às vítimas da ditadura e fala do risco de instituir uma "bolsa anistia".
Continua na Agência Carta Maior.
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segunda-feira, 16 de agosto de 2010
CARRETERA INTEROCEANICA: MUY SOSTENIBLE!...
"Rápido! Esconde a câmera, que vão bater na gente!", grita o motoqueiro enquanto cruzamos a selva a toda velocidade. O barulho distante de motores, uma virada brusca do guidão e, de repente, a mata desaparece, substituída por um deserto que se estende até onde a vista alcança, repleto de vilarejos miseráveis com barracas de campanha de lona azul ao lado de poças d'água pestilentas com homens mergulhados até o pescoço.
Em Guacamayo, na província de Madre de Dios, no coração da Amazônia peruana, o negócio milionário da atividade de extração ilegal de ouro ameaça destruir a região. Esta é uma grande consequência oculta do trecho final que permitirá a ligação do oceano Atlântico (porto de Santos) ao Pacífico (portos no Chile e no Peru) por meio de uma rede de rodovias, a maior parte delas já construídas, que também passa pela Bolívia. Com a construção, zonas produtoras de carne e de soja do Brasil terão acesso a portos no oceano Pacífico, de onde poderão embarcar para a China.
A estrada, em seu trecho peruano, terá como pontos finais os portos peruanos de Ilo, Matarani e San Juan de Marcona e deve ser concluída até o fim do ano.
"Isto aqui é o Velho Oeste. Não há lei nem presença do governo", afirma o biólogo peruano Enrique Ortíz, co-fundador da Associação de Preservação da Bacia Amazônica. "A rodovia está facilitando a imigração e barateando suprimentos essenciais, como a gasolina. Se nada for feito, daqui a 100 anos tudo isto se transformará em uma imensa savana, como no norte da Bolívia e em partes do Brasil. Não precisaremos mais ir até a Arábia Saudita para ver dunas".
Continua no Brasil de Fato.
Em Guacamayo, na província de Madre de Dios, no coração da Amazônia peruana, o negócio milionário da atividade de extração ilegal de ouro ameaça destruir a região. Esta é uma grande consequência oculta do trecho final que permitirá a ligação do oceano Atlântico (porto de Santos) ao Pacífico (portos no Chile e no Peru) por meio de uma rede de rodovias, a maior parte delas já construídas, que também passa pela Bolívia. Com a construção, zonas produtoras de carne e de soja do Brasil terão acesso a portos no oceano Pacífico, de onde poderão embarcar para a China.
A estrada, em seu trecho peruano, terá como pontos finais os portos peruanos de Ilo, Matarani e San Juan de Marcona e deve ser concluída até o fim do ano.
"Isto aqui é o Velho Oeste. Não há lei nem presença do governo", afirma o biólogo peruano Enrique Ortíz, co-fundador da Associação de Preservação da Bacia Amazônica. "A rodovia está facilitando a imigração e barateando suprimentos essenciais, como a gasolina. Se nada for feito, daqui a 100 anos tudo isto se transformará em uma imensa savana, como no norte da Bolívia e em partes do Brasil. Não precisaremos mais ir até a Arábia Saudita para ver dunas".
Continua no Brasil de Fato.
sábado, 14 de agosto de 2010
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
SENSO COMUM
Ao conjunto de idéias e valores predominantes numa época, caracterizados por serem tomados como universais e insuperáveis, dá-se o nome de senso comum. Sua função é confirmar-se e reafirmar-se, geralmente por comparações com outras idéias.
A título de exemplo, um nobre da Idade Média afirmaria:
"O feudalismo é uma mãe. Uma mãe aceita um filho com todos os seus defeitos e manias. O feudalismo aceita o ser humano tal como é, não pretende "consertá-lo" ou "transformar" o homem num "homem ideal", como o fez o Republicanismo quando matou mais de 100 milhões de pessoas. Não somos robôs. O feudalismo respeita os vícios e virtudes da natureza humana, por isso foi o único sistema que prosperou. Amém."
Numa definição mais simples, o senso comum é a compreensão de todas as coisas por meio do saber social, ou seja, é o saber que se adquire através de experiências vividas ou ouvidas do cotidiano. Engloba costumes, hábitos, tradições, normas, éticas e tudo aquilo que se necessita para viver bem.
No senso comum não é necessário que haja um parecer científico para que se comprove o que é dito, é um saber informal que se origina de opiniões de um determinado indivíduo ou grupo que é avaliado conforme o efeito que produz nas pessoas. É um saber imediato, subjetivo, heterogêneo e acrítico, pois se conforma com o que é dito para se realizar, utiliza várias idéias e não busca conhecimento científico para ser comprovado.
Por exemplo: o nosso misterioso nobre medieval, no afã de defender as blandícias do conservadorismo, não consegue conceber que as instituições e a vida medieval foram erguidos contra contra o conservadorismo de outras sociedades, contra as quais bateram-se por meio de revoluções sangrentas. Sociedades escravagistas ou onde reinava o sistema de escambo primitivo conheceram de perto o poder da espada feudal, da mesma forma que estes sucumbiram para os canhões republicanos. Ao longo de todo o século XX exércitos constitucionalistas assassinaram milhões, inclusive com golpes de Estado na América Latina.
Por que isso acontece?
Acontece porque os interesses que movem uma sociedade não são os dos "sistemas", mas os das pessoas que o compõem. E até nisso há que se fazer um adendo. A maioria das pessoas, em todas as épocas, tem interesses mais simples: comer, dormir, beber, dançar, namorar etc. Mas há um pequeno grupo cujos interesses materiais advém da conservação da sociedade da forma como está, ou seja, da forma como se organiza o trabalho e a produção de renda da qual elas vivem.
A mudança, naturalmente, não as interessa e até assusta. Pela mesma razão, para essas pessoas, transformação é sinônimo de golpe, ou de "mudar a natureza do homem".
E assim a filosofia do senso comum renasce a cada época. Como a fênix da lenda grega, subsiste eternamente por ciclos insuperáveis de morte e renascimento, com as cores que lhe dão em cada época.
A filosofia do senso comum opera poderosamente também na contemporaneidade. Sua decantada virtude conservadora nada mais é do que a velha prática de vender os interesses de um grupo como os valores de toda a sociedade. Com isso, ficam eternamente insuperáveis.
Mais sobre o senso comum da nossa época aqui.
A título de exemplo, um nobre da Idade Média afirmaria:
"O feudalismo é uma mãe. Uma mãe aceita um filho com todos os seus defeitos e manias. O feudalismo aceita o ser humano tal como é, não pretende "consertá-lo" ou "transformar" o homem num "homem ideal", como o fez o Republicanismo quando matou mais de 100 milhões de pessoas. Não somos robôs. O feudalismo respeita os vícios e virtudes da natureza humana, por isso foi o único sistema que prosperou. Amém."
Numa definição mais simples, o senso comum é a compreensão de todas as coisas por meio do saber social, ou seja, é o saber que se adquire através de experiências vividas ou ouvidas do cotidiano. Engloba costumes, hábitos, tradições, normas, éticas e tudo aquilo que se necessita para viver bem.
No senso comum não é necessário que haja um parecer científico para que se comprove o que é dito, é um saber informal que se origina de opiniões de um determinado indivíduo ou grupo que é avaliado conforme o efeito que produz nas pessoas. É um saber imediato, subjetivo, heterogêneo e acrítico, pois se conforma com o que é dito para se realizar, utiliza várias idéias e não busca conhecimento científico para ser comprovado.
Por exemplo: o nosso misterioso nobre medieval, no afã de defender as blandícias do conservadorismo, não consegue conceber que as instituições e a vida medieval foram erguidos contra contra o conservadorismo de outras sociedades, contra as quais bateram-se por meio de revoluções sangrentas. Sociedades escravagistas ou onde reinava o sistema de escambo primitivo conheceram de perto o poder da espada feudal, da mesma forma que estes sucumbiram para os canhões republicanos. Ao longo de todo o século XX exércitos constitucionalistas assassinaram milhões, inclusive com golpes de Estado na América Latina.
Por que isso acontece?
Acontece porque os interesses que movem uma sociedade não são os dos "sistemas", mas os das pessoas que o compõem. E até nisso há que se fazer um adendo. A maioria das pessoas, em todas as épocas, tem interesses mais simples: comer, dormir, beber, dançar, namorar etc. Mas há um pequeno grupo cujos interesses materiais advém da conservação da sociedade da forma como está, ou seja, da forma como se organiza o trabalho e a produção de renda da qual elas vivem.
A mudança, naturalmente, não as interessa e até assusta. Pela mesma razão, para essas pessoas, transformação é sinônimo de golpe, ou de "mudar a natureza do homem".
E assim a filosofia do senso comum renasce a cada época. Como a fênix da lenda grega, subsiste eternamente por ciclos insuperáveis de morte e renascimento, com as cores que lhe dão em cada época.
A filosofia do senso comum opera poderosamente também na contemporaneidade. Sua decantada virtude conservadora nada mais é do que a velha prática de vender os interesses de um grupo como os valores de toda a sociedade. Com isso, ficam eternamente insuperáveis.
Mais sobre o senso comum da nossa época aqui.
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
VIOLÊNCIA NA POLÍTICA
Não foi a primeira vez, nem será a última, que a violência cotidiana ultrapassa a dimensão privada e invade a arena pública no Acre. O episódio entre o candidato a senador João Correia (PMDB) e o jornalista Demóstenes Nascimento (clique aqui) só é salutar porque demonstra, pela enésima vez, a velha regra do embate político desonesto: eliminação do mais fraco (leia-se: vai sobrar para o abestado do jornalista).
É por isso que o jornalismo no Acre ainda é "isento", não o sendo na maior parte do mundo. As batalhas campais produzidas nas campanhas exigem como pressuposto que os jornalistas, ao contrário do que ocorre nos EUA, na Europa (e na África, Oceania, Ásia etc), comportem-se como verdadeiros sacos de pancada. Qualquer pergunta mais ácida, qualquer provocação mais elaborada, pode virar argumento político da oposição ou da situação. Só nos casos mais graves parte-se para as vias de fato, mas nem isso é incomum também - basta lembrar de Washington Aquino X Arnette Guimarães, de Antonio Stelio X Roberto Filho, das gangues "vermelha" e "azul" na campanha de 2006, e por aí vai (o leitor de fora do Acre que me desculpe o vácuo, mas quem mora aqui vai entender).
A ocorrência de atos violentos nas campanhas eleitorais é recorrente entre nós, praticamente uma tradição. Equivocada, claro, mas uma tradição. Desnecessário dizer que é antiética, mas acho salutar lembrar que o seu nascedouro é a incapacidade brutal de compreender o próximo como um ser de convicções e idéias, quase sempre divergentes das nossas.
É somente quando convicções e idéias divergentes são tomadas como ofensas que a violência é utilizada como um mecanismo de defesa. A diferença ofende, agride. Logo, é preciso eliminar o perigo reagindo contra ele. Esta reação pode ser abstrata (palavras) ou física (socos e pontapés). Ou ambas, como foi o caso.
Dito isso, vale acrescentar que a intolerância com a reivindicação do outro é algo poderoso em nossa cultura pseudo-revolucionária. É quase um acreanismo. Provam isso as manifestações imediatamente seguintes à divulgação do vídeo em que João e Demóstenes fazem sua performance. A oposição, por exemplo, tratou de atribuir a agressão ao "estado totalitário da imprensa acreana", posando imediatamente como a sua libertadora.
Não que a imprensa acreana não seja um mecanismo de divulgação dos atos do poder que a patrocina (característica comum a todos os meios de comunicação que têm receita, despesa e folha de pagamento). Mas não creio que o Demóstenes "atacou o candidato propositalmente para mostrar até onde pode chegar o projeto político totalitário do PT", que é o que parece sugerir o discurso da oposição e do próprio João Correia.
Posso estar errado, mas isso sim me parece uma idéia absurda, tão bizarra que nem mesmo os marqueteiros da Companhia de Selva a comprariam - nem o Demóstenes, quero crer. Muito menos eu.
Para utilizar o expediente da violência é preciso ser treinado para ver o outro como algo (um obstáculo que se interpõe ou facilita o alcance de coisas), como meio ao invés de fins. Na política isso se chama - agora sim - totalitarismo. É de enorme vocação totalitária, portanto, considerar indivíduos como coisas a serem vencidas ou subjugadas por meio da violência, em vez de seres humanos portadores de idéias e valores, seja lá por que razões.
Como alguém pode usar a bandeira da liberdade de expressão negando a expressão alheia, sem ser chamado de cínico por isso? Melhor: que tipo de sociedade permite que a vitimização seja um recurso do "argumento político", em vez de flagrante desonestidade ética? Democrática é que não é. Não existe democracia sem liberdade e não há liberdade sem ética, que pressupõe ver os cidadãos como seres integrais, em vez de objetos sem opiniões e valores . Ou "lacaios".
É por isso que o jornalismo no Acre ainda é "isento", não o sendo na maior parte do mundo. As batalhas campais produzidas nas campanhas exigem como pressuposto que os jornalistas, ao contrário do que ocorre nos EUA, na Europa (e na África, Oceania, Ásia etc), comportem-se como verdadeiros sacos de pancada. Qualquer pergunta mais ácida, qualquer provocação mais elaborada, pode virar argumento político da oposição ou da situação. Só nos casos mais graves parte-se para as vias de fato, mas nem isso é incomum também - basta lembrar de Washington Aquino X Arnette Guimarães, de Antonio Stelio X Roberto Filho, das gangues "vermelha" e "azul" na campanha de 2006, e por aí vai (o leitor de fora do Acre que me desculpe o vácuo, mas quem mora aqui vai entender).
A ocorrência de atos violentos nas campanhas eleitorais é recorrente entre nós, praticamente uma tradição. Equivocada, claro, mas uma tradição. Desnecessário dizer que é antiética, mas acho salutar lembrar que o seu nascedouro é a incapacidade brutal de compreender o próximo como um ser de convicções e idéias, quase sempre divergentes das nossas.
É somente quando convicções e idéias divergentes são tomadas como ofensas que a violência é utilizada como um mecanismo de defesa. A diferença ofende, agride. Logo, é preciso eliminar o perigo reagindo contra ele. Esta reação pode ser abstrata (palavras) ou física (socos e pontapés). Ou ambas, como foi o caso.
Dito isso, vale acrescentar que a intolerância com a reivindicação do outro é algo poderoso em nossa cultura pseudo-revolucionária. É quase um acreanismo. Provam isso as manifestações imediatamente seguintes à divulgação do vídeo em que João e Demóstenes fazem sua performance. A oposição, por exemplo, tratou de atribuir a agressão ao "estado totalitário da imprensa acreana", posando imediatamente como a sua libertadora.
Não que a imprensa acreana não seja um mecanismo de divulgação dos atos do poder que a patrocina (característica comum a todos os meios de comunicação que têm receita, despesa e folha de pagamento). Mas não creio que o Demóstenes "atacou o candidato propositalmente para mostrar até onde pode chegar o projeto político totalitário do PT", que é o que parece sugerir o discurso da oposição e do próprio João Correia.
Posso estar errado, mas isso sim me parece uma idéia absurda, tão bizarra que nem mesmo os marqueteiros da Companhia de Selva a comprariam - nem o Demóstenes, quero crer. Muito menos eu.
Para utilizar o expediente da violência é preciso ser treinado para ver o outro como algo (um obstáculo que se interpõe ou facilita o alcance de coisas), como meio ao invés de fins. Na política isso se chama - agora sim - totalitarismo. É de enorme vocação totalitária, portanto, considerar indivíduos como coisas a serem vencidas ou subjugadas por meio da violência, em vez de seres humanos portadores de idéias e valores, seja lá por que razões.
Como alguém pode usar a bandeira da liberdade de expressão negando a expressão alheia, sem ser chamado de cínico por isso? Melhor: que tipo de sociedade permite que a vitimização seja um recurso do "argumento político", em vez de flagrante desonestidade ética? Democrática é que não é. Não existe democracia sem liberdade e não há liberdade sem ética, que pressupõe ver os cidadãos como seres integrais, em vez de objetos sem opiniões e valores . Ou "lacaios".
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
SAINT-SIMON
Discípulo de Condorcet, Saint-Simon (ilustração) vê no grande Enclopedista o pensador ao qual "a ciência do homem deve seu último passo importante". Esta ciência do homem, apresentada como um ramo ora da física, ora da fisiologia, deve-se tornar positiva - S. Simon é o primeiro a empregar esse termo -, quer dizer, utilizar os métodos das ciências naturais, "pois não existe fenômeno que não possa ser observado do ponto de vista da física dos corpos brutos ou do ponto de vista da física dos corpos organizados, que é a fisiologia". A própria política "tornar-se-á uma ciência positiva quando os que cultivam este importante ramo dos conhecimentos humanos aprenderem a fisiologia e quando eles não mais considerarem os problemas a resolver apenas como questões de higiene".
Com toda essa fé ingênua do pensador do Iluminismo, S. Simon crê que esta ciência política positiva poderá ser neutra e objetiva, ultrapassando os diferentes pontos de vista, as "diversas formas de ver" contraditórias: "até aqui, o método da ciência da observação não foi introduzido nas questões políticas; cada um trouxe a sua maneira de ver, de raciocinar, de julgar, e resulta daí que ainda não se obteve nem precisões nas soluções, nem generalidades nos resultados. Chegou a hora de acabar esta infância da ciência..." Veremos como esta queixa sobre a "imaturidade" da ciência social, sobre o seu "atraso" para começar a ser como as outras (isto é, as ciências da natureza), seguida de exigência de que ela se curve ao método científico (natural), retornará constantemente sob pena dos autores positivistas (no século XX, inclusive).
S. Simon fala frequentemente d0 "corpo social" e define a ciência da sociedade como uma "filosofia social", "constituída pelos fatos materiais que derivam da observação direta da sociedade". Mas é importante sublinhar que esta "naturalização" da sociedade e da ciência social, esta utilização abusiva da analogia "orgânica" não tem neste autor - como terá nos positivistas posteriores - uma significação apologética conservadora em relação à ordem estabelecida; muito pelo contrário, ela tem uma função eminentemente crítica e contestadora. Apesar das repetidas garantias de S. Simon sobre o caráter "organizador" e não-revolucionário dos seus escritos, sua dimensão subversiva é inegável e não deixou de chamar a atenção das autoridades. Assim, é em nome das leis fisiológicas do organismo social e de sua "higiene" que ele apela abertamente pelo fim do absolutismo e por uma "mudança de regime" na França: "uma vez que a natureza inspirou aos homens, em cada época, a forma de governo mais conveniente, será exatamente de acordo com esse princípio que iremos insistir na necessidade de uma mudança de regime para uma sociedade que não mais se encontra nas condições orgânicas que puderam justificar o reino da opressão... por que conservaríamos hábitos higiênicos contraditórios com o nosso estado fisiológico?"
O combate para a ciência positiva do homem, está, em S. Simon, indissoluvelmente ligado à luta dos "produtores" (tanto empresários quanto operários) contra os parasitas, os "sanguessugas" clericais-feudais da Restauração. No momento em que S. Simon abandona este ponto de vista (que poderia designar como "burguês revolucionário") para reaproximar-se da classe que qualifica como "a mais pobre e a mais numerosa", é significativo que não mais fale em nome da ciência, mas sim da moral e da religião: ele o faz em seu "Novo Cristianismo" (1825), que já se situa no terreno do socialismo utópico.
BIBLIOGRAFIA
S. Simon, Cartas de um habitante de Genebra a seus contemporâneos (1803).
S. Simon, A parábola (1819).
S. Simon, Novo cristianismo (1825).
Com toda essa fé ingênua do pensador do Iluminismo, S. Simon crê que esta ciência política positiva poderá ser neutra e objetiva, ultrapassando os diferentes pontos de vista, as "diversas formas de ver" contraditórias: "até aqui, o método da ciência da observação não foi introduzido nas questões políticas; cada um trouxe a sua maneira de ver, de raciocinar, de julgar, e resulta daí que ainda não se obteve nem precisões nas soluções, nem generalidades nos resultados. Chegou a hora de acabar esta infância da ciência..." Veremos como esta queixa sobre a "imaturidade" da ciência social, sobre o seu "atraso" para começar a ser como as outras (isto é, as ciências da natureza), seguida de exigência de que ela se curve ao método científico (natural), retornará constantemente sob pena dos autores positivistas (no século XX, inclusive).
S. Simon fala frequentemente d0 "corpo social" e define a ciência da sociedade como uma "filosofia social", "constituída pelos fatos materiais que derivam da observação direta da sociedade". Mas é importante sublinhar que esta "naturalização" da sociedade e da ciência social, esta utilização abusiva da analogia "orgânica" não tem neste autor - como terá nos positivistas posteriores - uma significação apologética conservadora em relação à ordem estabelecida; muito pelo contrário, ela tem uma função eminentemente crítica e contestadora. Apesar das repetidas garantias de S. Simon sobre o caráter "organizador" e não-revolucionário dos seus escritos, sua dimensão subversiva é inegável e não deixou de chamar a atenção das autoridades. Assim, é em nome das leis fisiológicas do organismo social e de sua "higiene" que ele apela abertamente pelo fim do absolutismo e por uma "mudança de regime" na França: "uma vez que a natureza inspirou aos homens, em cada época, a forma de governo mais conveniente, será exatamente de acordo com esse princípio que iremos insistir na necessidade de uma mudança de regime para uma sociedade que não mais se encontra nas condições orgânicas que puderam justificar o reino da opressão... por que conservaríamos hábitos higiênicos contraditórios com o nosso estado fisiológico?"
O combate para a ciência positiva do homem, está, em S. Simon, indissoluvelmente ligado à luta dos "produtores" (tanto empresários quanto operários) contra os parasitas, os "sanguessugas" clericais-feudais da Restauração. No momento em que S. Simon abandona este ponto de vista (que poderia designar como "burguês revolucionário") para reaproximar-se da classe que qualifica como "a mais pobre e a mais numerosa", é significativo que não mais fale em nome da ciência, mas sim da moral e da religião: ele o faz em seu "Novo Cristianismo" (1825), que já se situa no terreno do socialismo utópico.
BIBLIOGRAFIA
S. Simon, Cartas de um habitante de Genebra a seus contemporâneos (1803).
S. Simon, A parábola (1819).
S. Simon, Novo cristianismo (1825).
terça-feira, 10 de agosto de 2010
MUDANÇAS CLIMÁTICAS
Livros citados no artigo. Clique para ampliar.
Entre uma tossida e outra por conta da fumaça que invadiu o mundo (cof, cof! quero dizer, Rio Branco, cof!), eis que surge o debate sobre o tal "aquecimento global". É a cultura da pauta jornalística: questões cruciais só viram debate no auge dos seus efeitos.
E surgem de forma enviesada. Mudança climática, por exemplo, é invariavelmente confundida com aquecimento global, como se fossem a mesma coisa. Ambientalismo é tomado por socialismo, com todo um espectro adjacente de teorias da conspiração. E a crise ambiental, mesmo demonstrada no contexto de uma crise estrutural que vai do esgotamento dos recursos naturais às crises diplomáticas entre os países, são tomadas como "ultra-esquerdismo aquecimentista".
Durma-se com um barulho desses!
É óbvio que o clima global está sofrendo uma transformação radical, não precisa ser cientista para saber. Basta - cof, cof! - existir, primeiro, e depois pôr a cara na janela. Conferir o noticiário sobre o clima em outras regiões do planeta também ajuda: nevascas inéditas, furacões gigantes, ondas de calor na Europa, seca na Amazônia e por aí vai. Na dúvida, basta entrevistar alguém mais velho sobre as "friagens de antigamente" ou sobre o "calor de antigamente". E por aí vai.
A teoria do aquecimento global antropocêntrico (causado pelo homem), por outro lado, é um salto espalhafatoso a partir desse dado empírico. Praticamente toda a mídia alternativa, ou seja, não-comercial, já alertou para o seu caráter não somente duvidoso, mas inviável, inclusive em artigos, livros, simpósios, seminários etc. O mais recente livro sobre o assunto, "A fraude do aquecimento global - Como um fenômeno natural foi convertido numa falsa emergência mundial", foi escrito pelo brasileiro Geraldo Luís Lino e tem prefácio de Luiz Carlos Baldicero Molion. Lançado no ano passado, o livro permanece na obscuridade por falta de divulgação.
A denúncia é basicamente a mesma desde quando a fraude foi descoberta em meados de 2007: movidos por promessas de lucro, cientistas do IPCC, o Painel Interclimático da ONU, aceitaram "editar" alguns dados de suas pesquisas para beneficiar uma bilionária indústria de matrizes energéticas "alternativas", especialmente a do hidrogênio. Fazem parte da obra: trocas de e-mails esclarecedores entre membros do IPCC, ligações entre vários "aquecimentistas" e indústrias de infra-estrutura e energia nos EUA, a inviabilidade dos números e previsões mais catastróficos e como governos e empresas lucram com o catastrofismo. O argumento vem sendo o mesmo há quatro anos, pelo menos. No resto do mundo, claro (cof, cof!)!
E a esquerda?
Parte da esquerda, como tanta gente boa, foi na onda da banda podre do IPCC. Porém, indepentemente da fraude do aquecimento global, o problema amplo da insustentabilidade da forma de produção de riquezas, que produz pobreza na mesma medida e com a explosão da violência servindo de indicador de "desenvolvimento", é o cerne do debate contemporâneo trazido pelos socialistas.
Aliás, essa discussão é inclusive anterior ao aquecimento global. Remonta aos filósofos do século XIX, a partir de Karl Marx, passou pela Escola de Frankfurt, esteve também na reflexão estruturalista, mereceu bons livros dos existencialistas e, graças ao desenvolvimentismo implantado pela Ditadura Militar criou no Brasil toda uma tradição de pesquisa que tem em Octavio Ianni, José Paulo Netto, Ricardo Antunes e outros os seus principais colaboradores.
Quem quiser fazer uma leitura sobre os limites estruturais da nossa época, e como essas crises nos âmbitos político, econômico, ambiental, diplomático, demográfico, social e mesmo teórico estão relacionadas, minha sugestão é "Para Além do Capital", do filósofo húngaro István Meszáros. Fica a dica.
Para obter informações atualizadas sobre a farsa do aquecimento global, clique aqui.
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
POR UMA TV MENOS IMBECIL
A seguir, minha sutil contribuição para melhorar a programação televisiva brasileira (clique nos slogans para ir aos respectivos sites):
- Canal 2: Sai entra
- Canal 4: Sai entra
- Canal 5: Sai entra
- Canal 8: Sai entra
- Canal 11: Sai entra
- Canal 13: Sai entra
- Canal 21: Sai entra
- Canal 27: Sai entra
- Canal 40: Sai entra
- Canal 50: Sai entra
- Canal 54: Sai entra
Exigiria também a criação, em canal aberto, das:
- TV Câmara de Vereadores de Rio Branco.
- TV Aleac (Assembléia Legislativa do Estado do Acre)
- Canal 2: Sai entra
- Canal 4: Sai entra
- Canal 5: Sai entra
- Canal 8: Sai entra
- Canal 11: Sai entra
- Canal 13: Sai entra
- Canal 21: Sai entra
- Canal 27: Sai entra
- Canal 40: Sai entra
- Canal 50: Sai entra
- Canal 54: Sai entra
Exigiria também a criação, em canal aberto, das:
- TV Câmara de Vereadores de Rio Branco.
- TV Aleac (Assembléia Legislativa do Estado do Acre)
sábado, 7 de agosto de 2010
sexta-feira, 6 de agosto de 2010
ORIGENS
Plácido de Castro, no centro de Rio Branco: à direita, escola e espada; à esquerda, o Quartel da PM...
Na verdade a unidade dos seringalistas só foi possível enquanto permaneceu a luta contra o "inimigo comum" – os bolivianos. Vencida esta etapa, os patrões se dividiram em muitas facções com interesses conflitantes. Havia facções pró e contra Plácido de Castro e começou, também, a se fazer a classificação dos seringalistas entre "históricos" e "não-históricos", sendo os primeiros aqueles que haviam participado, efetivamente, da campanha "revolucionária".
[...]
É desse período que o sentimento de "acreanidade" começaria a ser plasmado, constituindo-se num traço psico-cultural muito forte da população autóctone. Os "acreanos históricos", portanto, começavam a encarar com muitas reservas e desconfianças as autoridades nomeadas para o Território e, não poucas vezes, se insurgiram contra elas...
[...]
É nesse contexto de insatisfação crescente que os movimentos "autonomistas" se sucedem e se intensificam com o agravamento da crise da borracha, que já se fazia sentir desde o início da segunda década desse século. São criados "Partidos Autonomistas" nos Departamentos do Alto Acre, Alto Juruá e Alto Purus, agremiações estas que se caracterizaram pelo seu "elitismo e efemeridade" e que não guardavam entre si programas e objetivos comuns.
FERNANDES, Marcos Inácio. O PT no Acre: a construção de uma terceira via. Tese de mestrado. Ciências Sociais, UFRN, 1999. 153p.
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O discurso oficial da República oligárquica brasileira transformou a luta dos acreanos em "Revolução Acreana" e os que participaram desta são nomeados, numa linguagem eivada de simbolismos, de heróicos, bravos, destemidos, invencíveis, grandes na guerra, valores nobres...
E como expressão do ritual de unção do Acre brasileiro foram criados como símbolos o Hino Acreano, a Bandeira Acreana e o Escudo Acreano.
O nascimento do Acre institui um mundo de significações e, ao fazê-lo, institui a si mesmo instituindo um mundo de significações, as quais visam dar e manter a coesão do mesmo. O Acre não existiria sem ser instituinte e instituído. E sua instituição dependia das significações. E as significações se impõem pela linguagem, que é um código. Esses signos se constituem a tradição inventada, os quais têm como função não apenas cristalizar o momento de invenção do Acre brasileiro, mas incutir valores, crenças e normas de comportamento através seja da repetição, no caso do Hino Acreano, seja por meio de visualização reverenciosa nas condições de ícones sagrados do Acre.
[...]
O discurso cristão-católico e patriótico do Estado brasileiro republicano está presente na construção do Acre brasileiro. E, assim como o sangue de Cristo nos liberta de todo o mal, o derramamento do sangue dos acreanos os torna não só heróis, mais imunes ao mal, predestinados ao progresso. Os acreanos são divinizados por sua coragem, audácia e brasilidade.
BEZERRA, Maria José. Invenções do Acre - de Território a Estado – um olhar social... São Paulo: USP, 2005. 383 f. Tese (Doutorado em História Social) – Programa de Pós-Graduação em História. Instituto de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo – SP.
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Nessa construção do mito fundador do Acre, as diferenças nas relações sociais entre seringueiros e seringalistas são anuladas e colocadas sob o mesmo patamar de projetos. Desse modo, o índio, o seringueiro, o caboclo acreano, de um lado, e os seringalistas, de outro lado perdem suas características antagônicas e passam a ser concebidas valendo-se da mesma matriz, o combatente da revolução (Silva, 1996). Nessa anulação, parece até que os seringueiros tinham opção de aderir ou não à "guerra", quando os seus patrões se colocavam à disposição do comandante Plácido de Castro.
[...]
As oligarquias locais (acreana) desejavam que o Acre fosse elevado à condição de Estado, a fim de conformarem e exercerem o poder de uma maneira mais autônoma entre seus membros.
Prevaleceu a primeira alternativa, administração pela União, uma saída que antes de tudo beneficiava o poder federal no âmbito econômico e político, desagradando por sua vez tanto às oligarquias locais (acreana) quanto as regionais ligadas ao extrativismo do látex. A nova unidade administrativa, o Território Federal do Acre, teve como fonte matriz inspiradora os EUA, que adotavam no seu direito constitucional unidades federativas com essa denominação, mas como algo excepcional e não regular.
[...]
A modalidade Território Federal provocou descontentamento tanto dos seringalistas acreanos, que acreditavam na criação do Estado do Acre, quanto do governo do Estado do Amazonas, que tinha bastante interesse na área a ser incorporada a esse Estado, em detrimento das rendas oriundas do extrativismo do látex. Essa novidade agradou aos políticos do Pará que temiam a perda da hegemonia regional.
MORAIS, Maria de Jesus. "ACREANIDADE": invenção e reinvenção da identidade acreana. Rio de Janeiro: UFF, 2008. 301 f Tese. (Doutorado em Geografia). Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Federal Fluminense - UFF.
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
VEJA
Por: NovaE Jornalismo Investigativo
O grupo de mídia sul-africano Naspers adquiriu 30% do capital acionário da Editora Abril, que detém 54% do mercado brasileiro de revistas e 58% das rendas de anúncios em revistas no país. Para tanto, pagou 422 milhões de dólares. A notícia é de maio e foi publicada nos principais órgãos da mídia grande do Brasil. Mas não foi dada a devida atenção ao fato de a Naspers ter sido um dos esteios do regime do apartheid na África do Sul e ter prosperado com a segregação racial.
A Naspers tem sua origem em 1915, quando surgiu com o nome de Nasionale Pers, um grupo nacionalista africâner (a denominação dos sul-africanos de origem holandesa, também conhecidos como bôeres, que foram derrotados pela Grã-Bretanha na guerra que terminou em 1902). Este agrupamento lançou o jornal diário Die Burger, que até hoje é líder de mercado no país. Durante décadas, o grupo, que passou a editar revistas e livros, esteve estreitamente vinculado ao Partido Nacional, a organização partidária das elites africâneres que legalizou o detestável e criminoso regime do apartheid no pós-Segunda Guerra Mundial.
Como relata o jornalista Renato Pompeu, em artigo publicado na revista Caros Amigos, "dos quadros da Naspers saíram os três primeiros-ministros do apartheid". O primeiro diretor do Die Burger foi D.F. Malan, que comandou o governo da África do Sul de 1948 a 1954 e lançou as bases legais da segregação racial. Já os líderes do Partido Nacional H.F. Verwoerd e P.W. Botha participaram do Conselho de Administração da Naspers. Verwoerd, que quando estudante na Alemanha teve ligações com os nazistas, consolidou o regime do apartheid, a que deu feição definitiva em seu governo, iniciado em 1958. Durante a sua gestão ocorreram o massacre de Sharpeville, a proibição do Congresso Nacional Africano (que hoje governa o país) e a prolongada condenação de Nelson Mandela.
Já P. Botha sustentou o apartheid como primeiro-ministro, de 1978 a 1984, e depois como presidente, até 1989. "Ele argumentava, junto ao governo dos Estados Unidos, que o apartheid era necessário para conter o comunismo em Angola e Moçambique, países vizinhos. Reforçou militarmente a África do Sul e pediu a colaboração de Israel para desenvolver a bomba atômica. Ordenou a intervenção de forças especiais sul-africanas na Namíbia e em Angola". Durante seu longo governo, a resistência negra na África do Sul, que cresceu, adquiriu maior radicalidade e conquistou a solidariedade internacional, foi cruelmente reprimida - como tão bem retrata o filme "Um grito de liberdade", do diretor inglês Richard Attenborough (1987).
Renato Pompeu não perdoa a papel nefasto da Naspers. "Com a ajuda dos governos do apartheid, dos quais suas publicação foram porta-vozes oficiosos, ela evoluiu para se tornar o maior conglomerado da mídia imprensa e eletrônica da África, onde atua em dezenas de países, tendo estendido também as suas atividades para nações como Hungria, Grécia, Índia, China e, agora, para o Brasil. Em setembro de 1997, um total de 127 jornalistas da Naspers pediu desculpas em público pela sua atuação durante o apartheid, em documento dirigido à Comissão da Verdade e da Reconciliação, encabeçada pelo arcebispo Desmond Tutu. Mas se tratava de empregados, embora alguns tivessem cargos de direção de jornais e revistas. A própria Naspers, entretanto, jamais pediu perdão por suas ligações com o apartheid".
Segundo documentos divulgados pela própria Naspers, em 31 de dezembro de 2005, a Editora Abril tinha uma dívida liquida de aproximadamente US$ 500 milhões, com a família Civita detendo 86,2% das ações e o grupo estadunidense Capital International, 13,8%. A Naspers adquiriu em maio último todas as ações da empresa ianque, por US$ 177 milhões, mais US$ 86 milhões em ações da família Civita e outros US$ 159 milhões em papéis lançados pela Abril. "Com isso, a Naspers ficou com 30% do capital. O dinheiro injetado, segundo ela, serviria para pagar a maior parte das dividas da editora". Isto comprova que o poder deste conglomerado, que cresceu com a segregação racial, é hoje enorme e assustador na mídia brasileira.
Mas as relações alienígenas da revista Veja não são recentes nem se dão apenas com os racistas da África do Sul. Até recentemente, ela sofria forte influência na sua linha editorial das corporações dos EUA. A Capital International, terceiro maior grupo gestor de fundos de investimentos desta potência imperialista, tinha dois prepostos no Conselho de Administração do Grupo Abril - Willian Parker e Guilherme Lins. Em julho de 2004, esta agência de especulação financeira havia adquirido 13,8% das ações da Abril, numa operação viabilizada por uma emenda constitucional sancionada por FHC em 2002.
A Editora Abril também têm vínculos com a Cisneros Group, holding controlada por Gustavo Cisneros, um dos principais mentores do frustrado golpe midiático contra o presidente Hugo Chávez, em abril de 2002. O inimigo declarado do líder venezuelano é proprietário de um império que congrega 75 empresas no setor da mídia, espalhadas pela América do Sul, EUA, Canadá, Espanha e Portugal. Segundo Gustavo Barreto, pesquisador da UFRJ, as primeiras parcerias da Abril com Cisneros datam de 1995 em torno das transmissões via satélites. O grupo também é sócio da DirecTV, que já teve presença acionária da Abril. Desde 2000, os dois grupos se tornaram sócios na empresa resultante da fusão entre AOL e Time Warner.
Ainda segundo Gustavo Barreto, "a Editora Abril possui relações com instituições financeiras como o Banco Safra e a norte-americana JP Morgan - a mesma que calcula o chamado ‘risco-país’, índice que designa o risco que os investidores correm quando investem no Brasil. Em outras palavras, ela expressa a percepção do investidor estrangeiro sobre a capacidade deste país ‘honrar’ os seus compromissos. Estas e outras instituições financeiras de peso são os debenturistas - detentores das debêntures (títulos da dívida) - da Editora Abril e de seu principal produto jornalístico. Em suma, responsáveis pela reestruturação da editora que publica a revista com linha editorial fortemente pró-mercado e anti-movimentos sociais".
Além de ser controlada por grupos estrangeiros, a Veja mantém relações estreitas com o PSDB, que é o núcleo orgânico do capital rentista, e com o PFL, que representa a velha oligarquia conservadora. Emílio Carazzai, por exemplo, que hoje exerce a função de vice-presidente de Finanças do Grupo Abril, foi presidente da Caixa Econômica Federal no governo FHC. Outra tucana influente na família Civita, dona do Grupo Abril, é Claudia Costin, ministra de FHC responsável pela demissão de servidores públicos, ex-secretária de Cultura no governo de Geraldo Alckmin e atual vice-presidente da Fundação Victor Civita.
Não é para menos que a Editora Abril sempre privilegiou os políticos tucanos. Afora os possíveis apoios "não contabilizados", que só uma rigorosa auditoria da Justiça Eleitoral poderia provar, nas eleições de 2002, ela doou R$ 50,7 mil a dois candidatos do PSDB. O deputado federal Alberto Goldman, hoje um vestal da ética, recebeu R$ 34,9 mil da influente família; já o deputado Aloysio Nunes, ex-ministro de FHC, foi agraciado com R$ 15,8 mil. Ela também depositou R$ 303 mil na conta da DNA Propaganda, a famosa empresa de Marcos Valério que inaugurou um ilícito esquema de financiamento eleitoral para Eduardo Azeredo, ex-presidente do PSDB. Estes e outros "segredinhos" da Editora Abril ajudam a entender a linha editorial racista da revista Veja e a sua postura de opositora radical do governo Lula.
Veja mais aqui.
quarta-feira, 4 de agosto de 2010
POBREZA NOS EUA
O mapa mostra a taxa de pobreza (poverty rate) em relação ao total de habitantes. Clique para ampliar.
Por: The New York Times
"Pobreza na infância envenena o cérebro". Esse foi o começo de um artigo no “Financial Times” de sábado, resumindo uma pesquisa apresentada na semana passada na Associação Americana pelo Avanço da Ciência.
Como o artigo explicou, neurocientistas descobriram que "várias crianças que crescem em famílias muito pobres com baixo status social têm altos níveis de hormônios de estresse, que prejudicam o desenvolvimento neural. A conseqüência é afetar o desenvolvimento da linguagem e a memória – portanto, a capacidade de fugir da pobreza – pelo resto da vida da criança."
Então agora temos outra razão, ainda mais convincente, para se envergonhar do histórico dos EUA no fracasso da luta contra pobreza.
O ex-presidente Lyndon Johnson declarou sua "Guerra à Pobreza" há 44 anos. Contrário às opiniões cínicas, houve uma grande redução na pobreza nos anos seguintes, especialmente entre as crianças. O índice caiu de 23% em 1963 para 14% em 1969.
Mas o progresso estagnou logo depois. A política americana se voltou para a direita e as atenções foram do sofrimento dos pobres para os supostos abusos das rainhas do seguro-desemprego dirigindo Cadillacs, e a luta contra a pobreza foi quase que completamente abandonada.
Em 2006, 17.4% das crianças nos EUA viviam abaixo da linha da pobreza, mais do que em 1969. E até mesmo esse número provavelmente não diz tudo sobre a real profundeza da miséria de muitas crianças.
Viver na pobreza, ou perto dela, sempre foi uma forma de exílio, cortado da camada mais ampla da sociedade. Mas a distância entre os pobres e o resto de nós é muito maior do que era há 40 anos, porque a maioria das rendas dos americanos aumentou em termos reais enquanto a linha oficial da pobreza não. Ser pobre nos EUA de hoje, mais do que no passado, é ser um excluído em seu próprio país. E isso, nos dizem os neurocientistas, é o que envenena o cérebro de uma criança.
O fracasso do país em progredir na luta contra a pobreza, especialmente entre crianças, deveria causar muita reflexão. Infelizmente, o que parece provocar é uma enorme criatividade em elaborar desculpas.
Algumas dessas desculpas vêm em declarações de que os pobres dos EUA realmente não são tão pobres – uma afirmação que sempre me deixou em dúvida se aqueles que a fazem viram alguma televisão durante o furacão Katrina, ou se simplesmente olhou ao redor enquanto visitava uma grande cidade americana.
O principal, entretanto, é que desculpas para a pobreza nos EUA envolvem a afirmação que os EUA são uma terra de oportunidades, um lugar onde as pessoas podem começar pobres, mas se trabalharem duro se tornarão ricas.
Mas a verdade é que as histórias de Horatio Alger são raras (autor do século 19 que escrevia sobre como as crianças excluídas podiam alcançar o chamado "sonho americano"). De acordo com uma estimativa recente, crianças americanas com pais nos últimos quatro níveis da distribuição de renda têm uma chance de quase 50% de permanecerem assim – e cerca de dois terços de chance de continuarem estagnadas se forem negras.
Isso não é surpreendente. Crescer na pobreza o coloca em desvantagem em todos os passos.
Eu comparei esses novos estudos de desenvolvimento do cérebro em crianças novas com uma pesquisa do Centro Nacional para Estatísticas de Educação, que analisou um grupo de estudantes que estavam na oitava série em 1988. Por cima, o estudo descobriu que nos EUA moderno, o status dos pais ganha da capacidade: estudantes que foram muito bem em testes padrões, mas vieram de famílias mais humildes tinham menos chances de entrar em uma universidade do que os estudantes que tiveram resultados ruins, mas pais com uma situação melhor.
Nada disso é inevitável.
Índices de pobreza são muito mais baixos em países europeus do que nos EUA, principalmente por causa de programas do governo que ajudam os pobres e desafortunados.
E os governos que se focam nisso conseguem reduzir a pobreza. Na Grã-Bretanha, o governo do Partido Trabalhista que teve início em 1997 fez da redução da pobreza uma prioridade – e apesar de alguns retrocessos, seu programa de subsídios de renda e outras formas de ajuda tiveram grandes resultados. Pobreza infantil, em particular, foi cortada pela metade de acordo com a medida que mais corresponde à definição dos EUA.
Mais sobre o assunto aqui (em inglês).
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
PSICOPATIA E CAPITALISMO
Contra tudo e contra todos, mesmo com a virulenta uniformização da linguagem que insiste em se colocar acima da criatividade como um deus ex machina, alguns jornalistas acreanos teimam em produzir textos pessoais, com marca e estilo próprios, fugindo do fascismo estilístico implantado no Acre desde que os Diários Associados, de Assis Chateaubriand, fundaram por aqui o jornal O Rio Branco com amplo apoio dos generais de 64.
Alguém pode argumentar que a criação de O Rio Branco, em 1969 (três meses depois do lançamento do Ato Institucional Nº 5) representou um avanço em relação ao jornalismo anterior, fundado mais nos mexericos do colunismo social e nas trocas de farpas entre políticos de situação e oposição. Se alguém tiver a pretensão de fazer isso, por favor, siga o meu conselho: comece a ler os jornais atuais.
Antes que divague demais e perca o fio da meada, convém fazer jus ao título da postagem de hoje explicando que o motivo de tantos rapapés é a matéria "Psiquiatra cobra Hospital de Custódia no Acre", que a minha colega - e desde o ano passado, bacharel em Direito - Dulcinéia Azevedo publicou neste domingo em A Gazeta.
Trata-se, como verá o leitor menos ocasional, de uma verdadeira "puxada de orelha" no poder público, como convém ao bom jornalismo. Um tapa com luva - de mecânico de ônibus. Como se faz isso? Com preocupação social - leia-se: abandonando a idéia de que jornalismo é isento (outro legado fóssil da Ditadura). Escrever sempre tem um lado, já que trata-se de uma transposição do real. Ao escrever, recria-se o mundo por meio de palavras, e o universo de significados existente nessas palavras dependerá da amplitude de referências do leitor.
Isso não deveria ser assunto novo, mas infelizmente é, pelo menos aqui na terra-de-galvez-e-chico-mendes. Assim como será em breve a constatação de que o princípio da isenção jornalística, quando aplicado numa economia de mercado, favorece a voz do proprietário do jornal. A ideologia da isenção, no capitalismo, beneficia o veículo que a propaga.
Mas isso é questão para outro debate. O debate de momento, ainda no fluxo da onda de violência que invade o Acre sustentável, é o problema da psicopatia. Após o assassinato da Ana Eunice, várias matérias da imprensa local parecem sugerir que um dos muitos gargalos da segurança pública seria a proliferação de psicopatas, dada a truculência com que muitos desses crimes são cometidos.
Já discordei antes, mas vou agora, baixada a poeira, repetir e melhorar o argumento. Pra mim o problema fundamental da violência é de ordem ética: se o regime político é democrático e todos os cidadãos são iguais em direitos e deveres, mas dividem-se em classes, sendo a mais numerosa aquela formada por indivíduos cujo único poder é o de vender a sua capacidade de trabalhar para outra classe (algo que aproxima-se muito da história da Galinha dos Ovos de Ouro), logo, a violência é uma resposta óbvia, até meio lógica, à redução miserável das expectativas de vida.
Assim posta, a questão parece recair inteiramente no lombo dos pobres. É outro engano. A violência se estabelece quando o processo de produção da cidadania, o chamado "contrato social", é substituído por um sonoro "salve-se quem puder!". Esta substituição cria desníveis de cidadania (precisamente o contrário do princípio da isonomia jurídica), e inverte a máxima de Kant, que dizia que as pessoas não devem jamais ser tratadas como meios, mas como fins. No nosso marco político-econômico, os indivíduos são exclusivamente meios para se atingir coisas, como poder e dinheiro. Logo, a conduta da manipulação de meios, para a obtenção de coisas, em detrimento dos valores civilizacionais, é um princípio tido como válido eticamente e ainda celebrado como um grande trunfo da própria civilização! Vê-se então que trata-se de um problema amplo, processual, que nada tem de inerente à condição de pobreza (ainda que a coloque em um tipo de "faixa de risco ético").
Mas a questão é: como esse ambiente poderia não ser propício à produção da psicopatia?
Tenho ainda outra discordância. Mesmo que a psicopatia seja, nos termos da matéria da Dulcinéia, "agravada em ambiente desfavorável, ambiente familiar desestruturado, condições econômicas desfavoráveis" (ou seja, todas as características das sociedades contemporâneas, pelo menos em sua maior parte), penso que seria um grande perigo dar ao Estado o poder de separar pessoas de suas famílias pelo fato das primeiras serem "desobedientes às normas" ou "incapazes de se ajustarem socialmente".
Se eu estiver errado por favor me contestem, mas este me parece um passo, um passo grande - um pulo mesmo - na direção do fascismo...
Não era o cerne do nazismo o argumento do desajuste biológico para motivar e embasar "cientificamente" a perseguição a judeus, homossexuais, comunistas etc?
A ditadura brasileira utilizava a expressão "terroristas" em seus panfletos para designar a ação dos militantes de esquerda na luta contra os golpistas militares que derrubaram um presidente eleito e tomaram o governo do País (aliás, muita gente colaborava, e não duvido que colaborassem ainda hoje, para dedurar os filisteus comunas).
Nos EUA, o macartismo perseguiu, torturou e matou durante mais de 20 anos uma quantidade até hoje não revelada de "desajustados sociais" cujo único demérito era exatamente discordar do sonho dourado do American Way of Life, esse pesadelo mundial que é hoje compartilhado por todos, desde indígenas acreanos até a classe média dos próprios EUA.
Quero aproveitar e dizer que nos termos da normalidade (norma, regra) da nossa época, eu sou mentalmente incapaz de compreender muita coisa. Começando pela política, algo bizarro pra mim. Não consigo entender, nem aceitar, o motivo de uma democracia não ser democrática. Não me desce goela abaixo, nem com mil leituras de Alexis de Tocqueville, Hannah Arendt, Norberto Bobbio, dentre outros, a natureza corporativa do argumento segundo o qual a medida de uma sociedade democrática é o fortalecimento das instituições representativas, ao invés da própria democracia.
Logo, também não tenho a menor vontade de me ajustar ao que é considerado "socialmente justo", não quando o poder de exercer esta justiça não pertence a mim e deve ser comprado. Também não creio que o princípio da liberdade de ação, sob o qual formulou-se historicamente o direito à exploração de uma classe sobre a outra, seja algo verdadeiro, dados todos os argumentos acima.
Falando nisso, não acho que uma sociedade cindida entre proprietários e apropriados seja livre. E me parece forçoso mesmo dizer que sejamos uma sociedade, mesmo no sentido mais raso do termo. Se a política é o espaço da vida social, coletiva, é nela que se deveria tratar questões como liberdade, empreendimento, ethos público etc, pois estas coisas devem ser postas como direitos para o exercício da cidadania plena, não como mercadorias.
É isso o que temos hoje? Absolutamente, não. Hoje, as questões que deveriam ser discutidas pela política passaram a depender do indivíduo "livre no mundo", e a política tornou-se um estorvo, até mesmo um incômodo, para os indivíduos que impõem aos outros a sua liberdade. A "gratuidade" da política é insuportável para a concepção privada, mercadológica, que dilui a natureza em relações de custo-benefício. E como a própria política, ou os políticos, sucumbiram a esta concepção bizarra e antiética, potencialmente genocida e fratricida, o resultado não é outro: violência.
Produzir uma sociedade livre, de psicopatas ou de exploradores (ou de ambos), é condição e o próprio processo de redução da violência, tornando mais clara a identificação da psicopatia e de outros transtornos de personalidade hereditários. O capitalismo, tal como subsiste hoje, inviabiliza a localização do comportamento psicótico, pois assemelha-se a ele e, no limite, depende dele e o reproduz em série.
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