quinta-feira, 22 de julho de 2010

PRESERVAÇÃO x DESENVOLVIMENTO

Da Revista Sem Terra

Nas comemorações da Semana Nacional do Meio Ambiente, de 31 de maio a 9 de junho, ganharam maior ênfase os debates sobre a necessidade de ocupação ordenada e medidas mais concretas de proteção ambiental para desenvolvimento da região amazônica - o "tendão de Aquiles" dos governos há muitas décadas.

Maior ainda o desafio quando se trata de garantir para essa região um modelo de desenvolvimento cuja definição nem sempre corresponde aos interesses das partes envolvidas. Há tensão entre preservacionistas e desenvolvimentistas. Não por acaso o lema da Semana Nacional do Meio Ambiente foi "Meio Ambiente e Desenvolvimento: Dá pra casar".

O que está em questão é a opção por um desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações. Um modelo que não esgote os recursos naturais para gerações futuras, como definiu a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU para discutir e propor meios de harmonizar dois objetivos: o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental.

Entre os biomas brasileiros, a Amazônia é o que detém o maior número de áreas de proteção integral e o maior percentual de florestas oficialmente protegidas (3,2% da área total do bioma). No entanto, como mostra estudo da ONG WWF, apenas 0,38% da área dos parques e reservas hoje existentes na Amazônia está minimamente protegida de fato, pois eles não foram implementados ou encontram-se muito próximos a cidades. O Brasil é um dos signatários da Convenção da Diversidade Biológica, assinada por 162 países, em 1993, instrumento legal para assegurar a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais. O governo avisa que irá nesta direção.

Política do governo

A estratégia governamental começa finalmente a tomar corpo, a partir do Programa Amazônia Sustentável (PAS), em fase final de elaboração - um trabalho que envolve 13 ministérios, ONGs e governos estaduais - sob a responsabilidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e Ministério da Integração Nacional.

A realidade mostra que a presença de atividade econômica na região amazônica é inevitável, mas deve se dar organizadamente, cabendo ao governo criar infra-estrutura local, garantir a fiscalização e fazer cumprir a legislação ambiental. A dinâmica de exploração econômica das riquezas da região concentra-se na faixa ao longo da Transamazônica (sentido leste-oeste) e na rodovia BR 163 - Cuiabá-Santarém. Ali, 75% da terra pertence à União. "Portanto, é preciso separar o joio do trigo, ou seja, implantar o Ordenamento Fundiário, sem o qual nada pode melhorar na região", avalia Jörg Zimmermann, que responde pela Secretaria de Coordenação da Amazônia, do MMA.

A etapa de pavimentação e implantação do trecho final da rodovia BR-163 contará com medidas de proteção ambiental, definição das unidades de conservação e áreas de ocupação agrícola. "Será um contraponto ao que ocorreu com a Transamazônica, um desastre em termos ambientais e sociais", assinala Zimmermann. "Vamos evitar a dinâmica perversa da ocupação desordenada, com ordenamento territorial e, no caso dos assentamentos, estudos para exploração da área de acordo com a vocação de cada área".

Implementar iniciativas para integrar a região ao restante do país significa também a modernização das práticas produtivas e seleção de áreas prioritárias para conservação da biodiversidade, atividades previstas no PAS. Estão implantadas mais de 50 unidades de conservação de proteção integral - que correspondem a cerca de 4,12% do bioma.

Em comparação com os demais biomas brasileiros, a Amazônia é o que detém o maior número de áreas de proteção integral (26) e também o maior percentual de florestas oficialmente protegidas (3,2% da área total do bioma). Calcula-se que as unidades de conservação de desenvolvimento sustentável ocupam área correspondente a menos de 10%.

Dificuldades

Mas a lista de obstáculos é longa, a começar pelo desconhecimento científico sobre a maior parte da biodiversidade, o que agrava a questão de definir e demarcar áreas destinadas à conservação. Os ainda parcos conhecimentos sobre flora, fauna e processos ecológicos na região tornam o processo de escolha muito mais difícil. Somem-se a isso questões como expansão da fronteira agrícola, expansão urbana e industrial, biopirataria, desmatamento, grilagem de terras, poluição de recursos hídricos, populações vivendo abaixo da linha da pobreza. Sem esquecer as divergências quanto ao impacto provocado pelas grandes hidrelétricas. Todos estes componentes evidenciam a necessidade urgente de uma estratégia governamental para a região. É neste quadro complicado que o governo pretende atuar.

A Revista Sem Terra buscou opiniões de três especialistas paraenses e de um representante da ONG Instituto Sócio-Ambiental (ISA), que apontam erros e acertos até agora e levantam questões relevantes para o desenvolvimento amazônico.

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Márcio Santilli, ex-presidente da Funai, é membro do Conselho Diretor do Instituto Sócio-Ambiental (ISA):

- Há diferentes forças e interesses representados no governo, que pressionam pela expansão da fronteira agrícola.

Como analisa o tema de exploração econômica com preservação?

Márcio Santilli - Historicamente a Amazônia foi tida como uma espécie de "fundo de quintal" dos países que exercem soberania sobre a região - uma reserva de saque dos recursos naturais, quase sempre em função de atividades, modelos e interesses organizados de fora prá dentro dela. Assim, quando se desmata para garimpar, implantar pastagens ou culturas de fora, perdem-se riquezas desconhecidas e inexploradas em função de um negócio já mais consolidado. O conhecimento sobre a floresta e os demais recursos naturais da região deveria ser o carro-chefe de uma estratégia de desenvolvimento da região. O uso sustentável da biodiversidade pode viabilizar recursos mais significativos, a longo prazo, que a venda de commodities e de produtos primários do extrativismo.

Em sua opinião os planos do governo para a região estão no rumo certo desta harmonização entre progresso/ocupação/conservação da floresta?

MS - Há conflitos não resolvidos na sociedade entre diferentes visões sobre o desenvolvimento da Amazônia, que também se projetam sobre a estrutura e as políticas do governo. O Ministério do Meio Ambiente busca a transversalidade no tratamento das questões ambientais e amazônicas, de modo que o conjunto dos ministérios assuma a perspectiva do desenvolvimento sustentável, o que é correto. Mas há diferentes forças e interesses representados no governo, que pressionam pela expansão da fronteira agrícola ou defendem o crescimento econômico a qualquer custo. As obras de infra-estrutura que constam do PPA, por exemplo, projetam um novo fluxo de ocupação com impactos para a floresta e para as populações tradicionais, que, se tivessem a mesma força política, provavelmente demandariam por outras prioridades de investimento.

Qual seria o maior entrave entre estas duas correntes?

MS - A questão é o modelo de desenvolvimento que se quer. A crise ambiental atual, com a temperatura do mundo crescendo e provocando mudanças climáticas, resulta de um sistema produtivo insustentável, baseado no carvão, no petróleo e na alteração da cobertura vegetal, e em níveis elevadíssimos de consumo para uma minoria da população mundial. Já vivemos no Brasil modelos de crescimento econômico que geraram riquezas para alguns e deixaram miséria e passivos ambientais imensos para o conjunto da sociedade, como foi a ocupação da Amazônia durante a ditadura militar. Mas o Brasil ainda tem chance de se desenvolver sem repetir os erros dos outros e os do nosso passado, valorizando seu patrimônio de diversidade cultural e ambiental. O socioambientalismo não é o preservacionismo dos países ricos, mas uma proposta que junta os interesses sociais com o uso sustentável dos recursos naturais, apropriada aos países que precisam desenvolver-se, como o Brasil. Mas se opõe aos que exploram o desespero dos miseráveis e dos desempregados, com promessas de desenvolvimento a qualquer preço, o que acaba produzindo ainda mais miséria depois.

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Aluízio Leal, professor e pesquisador da Universidade Federal do Pará (UFPA):

- A pressão para a construção de mega-hidroelétricas está cada vez maior, e as enormes jazidas minerais da região serão objeto de assalto pelo capital internacional.


É possível afastar o destino colonial imposto à Amazônia?


Aluízio Leal - Não neste modelo econômico e político. Esse destino sempre foi a base da ocupação e da exploração da região. A colonização é um processo histórico que sempre refletiu as relações entre sociedades diferentes, quando a mais desenvolvida sob o ponto de vista técnico é construída sobre a desigualdade social. É inevitável que a mais "desenvolvida" tenda a impor à outra essa desigualdade, sob a forma de exploração colonial. Isso se agrava quando a menos "desenvolvida" possui ou força de trabalho capaz de ser explorada ou riquezas naturais capazes de serem rapinadas. Essas duas coisas têm o poder de provocar, do modo mais terrível, a ambição e a cobiça do colonizador. É por isso que a Amazônia sempre foi mantida, no contexto brasileiro, como uma colônia interna. Na ditadura militar se iniciou esse novo "ciclo" e se intensificaram as novas medidas para manter a Amazônia nas condições de "neocolônia interna", excluindo-a das decisões mais estratégicas a respeito de si mesma e deixando sua administração política nas mãos da oligarquia local, afinada com esse modelo. Enquanto estiver presa ao mercado mundial capitalista, jamais sairá da sua condição de região saqueada e de sociedade cuja população deverá continuar mantida sob condições sociais de miséria que o capitalismo produz.

Como avalia os 20 anos do pólo de alumínio implantado na década de 80 com os benefícios do programa Grande Carajás?

AL - Consolidou-se integralmente. A implantação da Alunorte, destinada a produzir pasta de alumínio para a Albras fabricar alumínio primário, havia sido impedida pela Alcoa, ainda na década de 80, numa briga de multinacionais que ameaçou colocar no mercado alumínio mais barato, produzido na Alumar, de São Luís do Maranhão, caso os japoneses pretendessem manter a construção da Alunorte. A expansão do mercado mundial possibilitou o entendimento entre essas multinacionais, com a Amazônia assumindo o prejuízo da briga, garantindo-se à Albras energia mais barata do que o custo da sua produção na hidroelétrica do Tucurui (lá, custa aproximadamente 24 dólares para produzir um megawatt que a Eletronorte vende para a Albras por apenas 15 dólares, o que dá um prejuízo de aproximadamente 37,5% sobre o custo de produção). Isso significa uma receita de aproximadamente 50 milhões de dólares/ano de energia que o complexo Albras/Alunorte deixa de pagar à Eletronorte e que, obviamente, acaba sobrando para o povo, na outra ponta da corda. O pólo de alumínio foi entregue integralmente ao capital internacional com a privatização da Vale do Rio Doce. E está em vias de ser ampliado, pelas políticas de globalização e de privatização do setor elétrico.

A Amazônia sofrerá conseqüências dos últimos acontecimentos internacionais, sobretudo nos EUA?

AL - Não há dúvida de que, com o agravamento da crise mundial capitalista, as regiões ricas em natureza deverão sofrer um assalto crescente do capital. Atualmente, as políticas de ocupação e exploração da Amazônia são de devastação. A pressão para a construção de mega-hidroelétricas está cada vez maior e as enormes jazidas minerais da região serão objeto de assalto pelo capital internacional à medida que a crise for se agravando. Some-se a isso um fato: de toda essa imensa produção de riqueza à base da rapina, só fica na Amazônia a parte raquítica dos colaboradores regionais: ou a oligarquia tradicional local, que sempre foi entreguista e incompetente, do ponto de vista capitalista, ou o empresariado aventureiro que veio de fora para fazer lucro à custa da devastação.

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Lúcio Flávio Pinto, sociólogo, jornalista, autor de diversos livros sobre questões amazônicas:

- Sem a ciência na vanguarda de qualquer ação na região, pública ou privada, a Amazônia não terá futuro digno.


Por que a Amazônia tem dificuldade de se desenvolver?

Lúcio Flávio - Porque o efeito multiplicador dos investimentos vai ocorrer além dos seus limites. A Amazônia foi "especializada" em matéria-prima e insumos, os semimanufaturados, que os exportadores vendem no exterior sem pagar imposto e ainda com direito a restituição. Seus produtos de exportação começam com a energia bruta, da qual é a terceira maior exportadora do Brasil. Uma empresa que se instala no Maranhão, estado vizinho do Pará, onde está a hidroelétrica de Tucuruí, a maior inteiramente nacional (responsável por 8% da energia brasileira), não paga ICMS. Já a empresa paraense paga. E o cidadão paraense paga uma das tarifas mais altas do país, sendo que um terço dos paraenses não tem energia elétrica. Mas a Albras, empresa nipo-brasileira que produz alumínio e é a maior do Brasil (a segunda do continente e a sexta do mundo), paga uma tarifa três vezes menor. A energia que lhe é fornecida, de Tucuruí, é três vezes mais barata. O subsídio que proporcionou essa tarifa, somado, equivale ao investimento da fábrica, de 1,6 bilhão de dólares. É como se a Eletronorte lhe tivesse devolvido uma fábrica de graça no período do contrato, de 20 anos. E quando o lingote de alumínio chega ao Japão, o maior comprador (a Albras lhe assegura 15% de todo o alumínio de que precisa), o valor acrescentado ao produto na transformação industrial o eleva em quatro vezes. Por isso a Amazônia cresce como rabo de cavalo: para baixo.

A que se deve essa anomalia?

LF - À deterioração dos preços dos produtos amazônicos, preferencialmente destinados à exportação para gerar divisas. Quando o primeiro trem de minério de ferro saiu de Carajás, a maior província mineral do planeta, cada tonelada valia 25 dólares. Hoje o preço é comercializado em pouco mais de 13 dólares. Na época diziam que se devia exportar mesmo assim, porque logo diminuiria ou cessaria de vez o consumo desses minérios pela "nova onda" dos novos materiais. Pois bem: o projeto básico de Carajás se viabilizava com 20 milhões de toneladas de minério de ferro. No ano passado a mina produziu 54 milhões de toneladas. Neste ano, chegará a 70 milhões e, em 2007, a 85 milhões. Para compensar a perda de valor relativo, exportam-se volumes físicos cada vez maiores do produto. Isso gera uma grandeza física, mas não uma grandeza qualitativa. Daí as relações de troca desfavoráveis à região, que vende muito, mas barato, e tem que produzir cada vez mais para crescer quantitativamente. Não há, porém, efeito multiplicador do investimento.

Qual seria a saída?

LF - Investir maciçamente em ciência, tecnologia e conhecimento aplicado, não só formando quadros competentes dentro da região, com infra-estrutura adequada, mas atraindo pessoal de linha de frente do exterior para partilhar seus conhecimentos e fazer a máquina do saber avançar além das frentes econômicas, orientando-as e cerceando-lhes a expansão quando se tornam irracionais e destrutivas. Infelizmente, nunca a verba de C & T da região sequer traduziu sua grandeza democrática. Tem ficado abaixo de 1%, quando a população da Amazônia é, pelo critério menos favorável (o da Amazônia Clássica), de 7% da população nacional. Sem a ciência na vanguarda de qualquer ação na região, pública ou privada, a região não terá futuro digno. Só sabendo mais do que ninguém sobre a Amazônia e tendo uma estrutura institucional respeitável, estaremos em condições de separar o joio do trigo. Precisamos disso porque sem o intercâmbio científico e tecnológico a região estará sempre atrasada em relação à sua história, incapaz de responder aos desafios nos momentos em que eles se apresentam de forma prática.

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Maurílio Monteiro, professor e pesquisador do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, da Universidade Federal do Pará:

"É necessário e possível implementar uma estratégia de desenvolvimento fundamentada em vantagens competitivas socialmente criadas."



É possível combinar desenvolvimento econômico e sustentabilidade na Amazônia?


Maurílio Monteiro - As estratégias de desenvolvimento na Amazônia foram associadas, na segunda metade do século passado, à visão de que era necessário criar estruturas e espaços (pecuária de corte, grandes empresas e fazendas nas quais se pratica monocultura homogêneos e gigantescas empresas mineradoras) como vetores capazes de impulsionar o desenvolvimento regional. As lógicas que presidiram os "grandes" projetos na região, na década de 80, eram pautadas pela crença de que os agentes locais não têm condições de atuar como força propulsora do desenvolvimento regional; pelo descolamento social das instâncias envolvidas; pela convicção na superioridade e na maior eficiência das grandes estruturas produtivas; e pela rejeição aos sistemas produtivos que operam em pequena escala, dentre eles os camponeses, apontados como tradicionais, de baixa rentabilidade e ambientalmente imprudentes. Isso fez com que o Estado estimulasse a concentração de capitais para intervenções na região, o que enseja concentração de renda, pois deram-se por meio do uso insustentável de sua base natural; da ampliação das mazelas sociais; da concentração de riquezas e de poder econômico. Recorreu-se ao uso da base natural da região para o atendimento de necessidades presentes de alguns segmentos da sociedade. Os usos mais qualificados das especificidades naturais da região foram quase sempre negados ou postergados. A exploração dos estoques minerais, madeireiros, de terra, pesqueiros, entre outros, esteve na base dos projetos de desenvolvimento regional, mas de forma desvinculada das necessidades cotidianas da maioria da população. O modelo dominante portanto, funda-se na exploração do que podemos chamar de "vantagens comparativas" derivadas do baixo custo do uso dos recursos naturais da região. A mercantilização destes recursos, como no caso dos minérios, implicou a adoção de procedimentos industriais padronizados em termos globais, como a lavra da bauxita, sua transformação em alumina e posteriormente em alumínio primário; a lavra do minério de ferro, a pelotização deste minério, a produção de ferro gusa e, no futuro próximo, do aço. A fragilidade desta estratégia se expressa tanto em termos temporais quanto espaciais.

As "vantagens comparativas" limitam-se ao presente, não podem sustentar um desenvolvimento continuado, nem impulsionar dinâmicas de modernização amplas e socialmente enraizadas. Nestes termos, o equacionamento da questão do desenvolvimento econômico e de sua relação com sustentabilidade na Amazônia implica implementar um modelo de desenvolvimento que levado a cabo destrói a base natural. É necessário e possível implementar uma estratégia de desenvolvimento fundamentada em "vantagens competitivas socialmente criadas" e integradas ao uso sustentável da base natural da região, superando a visão preconceituosa sobre a capacidade de inúmeros agentes locais, dentre eles os camponeses.

As ações propostas pelo governo federal contemplam as expectativas da região?

MM - A análise das propostas do atual governo para a Amazônia vincula-se em grande medida à estratégia geral expressa no Plano Plurianual 2004-2007 - que tem como ponto de referência a visão de que o desenvolvimento econômico do país está bloqueado pelas restrições que produzem vulnerabilidade externa e interna. A primeira delas, vinculada à baixa capacidade de geração de divisas na balança comercial e de atração de capitais produtivos, que torna o Brasil altamente dependente de capitais para fechar suas contas com o resto do mundo. Mas o PPA indica que a principal restrição está associada à má distribuição da renda. Em linhas bastante gerais, é possível dizer que o governo preconiza uma estratégia de desenvolvimento que prevê, primeiro, reduzir a taxa de juros e com isto elevar a capacidade de investimento das empresas e do governo e, segundo, dotar as famílias de capacidade de consumo sustentável, bem como manter o governo com capacidade de investimento. O grande problema é que tais posicionamentos têm desdobramentos muito concretos sobre os processos de desenvolvimento em curso na Amazônia, pois tais prioridades convergem com a ação de agentes econômicos que se valem das "vantagens comparativas" derivadas do baixo custo do uso dos recursos naturais da região. Estas lógicas se distanciam da possibilidade de estabelecer redes de relações sociais, econômicas, políticas e ambientais que sejam impulsionadoras do desenvolvimento regional baseado na construção de arranjos produtivos locais. Certamente os estrategistas do governo poderiam indicar que se trata de um primeiro momento no qual as forças sociais, que operam com uma visão de desenvolvimento apegada a noção das "vantagens comparativas" atribuídas ao uso da base natural da região, teriam papel importante no curto prazo, mas em termos estratégicos cumpririam o papel de apoiar o projeto nacional em curso. E num segundo momento conteria outro foco, voltado à implementação de processos de desenvolvimento fundamentados no estabelecimento de "vantagens competitivas socialmente criadas" e integradas ao uso sustentável da base natural da região. Trata-se de uma possibilidade.

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