terça-feira, 30 de setembro de 2008

CAMINHOS PARA UMA COMUNICAÇÃO DEMOCRÁTICA

Certas reviravoltas da História parecem se dar para recordarmos que “o tempo não pára”, como escreveu certa vez Cazuza. Mesmo quando tendências aparentemente portadoras de novidade parecem se impor, é bom lembrar que “ainda estão rolando os dados”. Algo assim está se passando no campo decisivo das Comunicações.

Há cerca de uma década, ele parecia minado pela oligopolização. Uma onda de inovações tecnológicas havia tornado possível, por exemplo, produzir jornais inteiramente impressos em quatro cores, exibir imagens geradas por equipes de TV em qualquer parte do mundo, fascinar multidões nos cinemas com efeitos especiais extraordinários.

Tais tecnologias, contudo, apenas aprofundavam o caráter essencial da comunicação de massas: um grupo cada vez mais reduzido de emissores transmitia conteúdos, de forma ultra-vertical, para audiências cada vez maiores. Para satisfazer o gosto do público, em qualquer mídia, era necessário possuir equipamentos muito sofisticados e caros. Por isso, a evolução tecnológica havia sido acompanhada por uma penetração brutal da grande empresa nos domínios da imprensa. Em toda parte, a mídia estava associada ao grande poder econômico – em particular, a grupos financeiros e em alguns casos (como o da França) da indústria... de armamentos.

Por ironia, exatamente no momento em que o universo da oligomídia parecia consolidado, ele foi sacudido por uma invenção surgida no mundo da guerra, e acelerada nos grandes de circuitos financeiros: a internet. A rede mundial de computadores nasceu como um sistema capaz de ativar o arsenal nuclear dos Estados Unidos a partir de qualquer ponto, caso um ataque atômico inimigo devastasse parte do país. Por isso, deveria ser obrigatoriamente horizontal e não-hierárquica. Mais tarde, ela viabilizou o surgimento de um mercado financeiro global e permanente, por onde circulam cerca de 5 trilhões de dólares ao dia, e por meio do qual se ampliam a concentração de riquezas e as desigualdades abissais que marcam nossa época.

A introdução da internet no reino das relações quotidianas, no início dos anos 1990, seguia uma lógica semelhante. Ao promover a automatização de inúmeras atividades que antes dependiam de trabalho humano, e ao atingir potencialmente os consumidores de todo o mundo, ela permitia vislumbrar uma nova onda de ampliação de lucros, pressões sobre os direitos sociais e oligopolização. Tudo isso também se daria nas comunicações. Numa primeira fase, os astros da net foram empresas como a Amazon, cuja vocação essencial é o comércio sem fronteiras.

* * *

Em uma de suas peças mais geniais, Brecht recria um Galileu Galilei que alerta: ainda mais importante que as grandes descobertas científicas é permitir que sejam apropriadas pelas multidões. Sem que ninguém o previsse, a internet desencadeou uma revolução de alcance mundial e desdobramentos ainda imprevisíveis.

A velha comunicação de massa, inaugurada com a invenção dos tipos móveis, por Gutenberg, está sob ameaça. Porque ao invés de se limitarem a consumir o que o oligopólio oferecia em escala inédita, os seres humanos deram-se conta de que a nova ferramenta lhes auxiliava a produzir conteúdos e – mais importante – permitia que circulassem por todo o planeta, agora sem necessidade do capital como intermediário. Uma banda de rap de qualquer periferia já não depende da gravadora – com suas exigências, contratos leoninos e padrões estéticos – para expor seu trabalho. Já pode, inclusive, manter contato com grupos com motivações semelhantes, em qualquer parte do planeta, e produzir em sinergia com eles.

Um movimento social com interesse em difundir uma causa — e criatividade para torná-la sedutora — pode fazê-lo por meio de uma campanha de alcance global, difundida no YouTube. Grupos de cidadãos são capazes de se informar reciprocamente, e de debater temas políticos relevantes, por meio de redes de blogues que podem se tornar muito mais atraentes que os velhos jornais de papel.

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Em Caminhos para a Comunicação Democrática, o leitor percorrerá todos estes temas. Quatro textos fazem a denúncia do oligopólio. Em Os novos imperadores da mídia, Ignacio Ramonet traça um panorama da concentração empresarial na imprensa, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Ele chama atenção para o caso emblemático francês, onde dois grupos (Dassault e Lagardère), ambos com origem na indústria de armamentos, controlavam, já em 2002, algumas das principais revistas (L’Express, L’Expansion, Paris Match, Elle, Pariscope, Télé 7 jours ) e editoras (Hachette, Fayard, Larousse, Grasset, Robert Laffont, Bordas e Stock), além do segundo maior jornal nacional (Le Figaro) e da grande empresa de distribuição da mídia impressa (Relay).

Ramonet alfineta: “realiza-se a velha e temida profecia: alguns dos maiores veículos de comunicação estão nas maõs dos mercadores de canhões”.

O escritor britânico John Pilger comenta, em outro artigo, alguns dos efeitos da concentração. Ele cita Jorge Orwell, em A Revolução dos Bichos, para lembrar que “as idéias impopulares podem ser mantidas em silêncio e os fatos incômodos, permanecerem na sombra, sem necessidade de nenhuma proibição oficial”. Ao lamentar as pressões do então primeiro-ministro Tony Blair sobre a BBC, Pilger alerta para o risco de surgir, na Grã-Bretanha, um jornalismo tão dócil quanto se tornou o norte-americano.

Como blague, recorda o relato do também escritor Simon Louvish sobre o comentário de um grupo de soviéticos em viagem aos EUA. Ao repararem que todos os jornais publicavam notícias mais ou menos idênticas sobre todos os fatos mais relevantes, eles se admiraram: “Em nosso país, para obter tal resultado temos uma ditadura. Prendemos pessoas, arrancamos suas unhas. Vocês não têm nada disso. Qual o segredo? Como fazem?”

O francês François Brune recorre a uma análise que procura abarcar jornalismo e publicidade. Ele mostra que ansiosa em evitar “que o consumidor se desconecte”, a comunicação de massas mergulha, tanto quanto a propaganda, na tentativa de reduzir o presente aos “grandes acontecimentos”: a Copa do Mundo, o lançamento da última produção de Hollywood, Diana eternamente no túnel, algumas fomes e massacres.

Por fim, Serge Halimi propõe: Contra o jornalismo de mercado, incentivar a dissidência. No artigo, escrito em 1999, porém atual, ele sustenta: “como faziam os stalinistas, os apóstolos da globalização atribuem a seus críticos tamanha dose de irracionalidade que seria plenamente justificável um programa de reeducação”. Ele mesmo contra-propõe: “Se o fim dos regimes policiais na Europa Oriental (...) serviram para nos ensinar alguma coisa, não foi certamente a necessidade do totalitarismo dos mercados financeiros. Foi o valor da dúvida e a necessidade urgente da dissidência”.

Dois artigos fazem a transição entre denúncia e alternativa. O mesmo Ignacio Ramonet, um intelectuais mais ativos no debate contemporâneo sobre comunicações, propõe O Quinto Poder. Sua linha de raciocínio é clara. Vistos durante boa parte da modernidade como o “quarto poder” — aquele que defendia os cidadãos contra os abusos dos demais poderes — , os meios de comunicação desertaram deste papel, por tudo o que se viu até aqui. Em resposta, a própria cidadania deveria agir autonomamente, como “quinto poder”. Um meio prático de fazê-lo é criar um Observatório Internacional das Mídias, que funcionaria como um contra-poder, denunciando deformações e exigindo permanentemente que se efetive o direito à comunicação.

Em complemento, o professor Venício de Lima debate O que fazer para democratizar as comunicações no Brasil. Seu texto articula análise teórica com um plano concreto de trabalho, dividido em sete pontos. Eles contemplam da criação de uma mídia alternativa viável economicamente à criação de associações de ouvintes, telespectadores e leitores; de cursos de comunicação menos centrados nas mídias de mercado à revisão das concessões de emissoras de TV e transferência, aos municípios, da incumbência de legislar sobre rádios comunitárias.

A coletânea não estaria completa sem quatro artigos voltados especificamente ao surgimento do novo paradigma: o da comunicação compartilhada e participativa. Em Muito além de Gutenberg, Antonio Martins procura soluções para dois problemas. O primeiro é criar, em alternativa ao oligopólio, não apenas milhares de blogs, mas também espaços públicos horizontais, onde os cidadãos debatam os grandes problemas de seus países e do mundo – e as alternativas para eles. O segundo é encontrar formas não-mercantis de remunerar o trabalho dos comunicadores e produtores culturais em geral.

Conhecido por seus estudos sobre redes, Manuel Castells contribui com A era da intercomunicación. Para ele, o novo paradigma é portador de esperanças precisamente porque rompe a capacidade de ocultar – principal mecanismo pelo qual se exerce o poder de manipulação da mídia. São cada vez mais freqüentes os casos em que movimentos cidadãos servem-se da blogosfera, ou mesmo de telefones celulares, para difundir informações sonegadas pelos meios de mercado.

A tendência vai se aprofundar, porque “a comunicação compartilhada está sendo recuperada pelos movimentos sociais”. “Falta pouco para que estes, e os indivíduos em rebelião, comecem a agir sobre a grande mídia, a controlar as informações, a desmenti-las e até mesmo a produzi-las”.

Em Redes colaborativas e precariato produtivo, a brasileira Ivana Bentes foca sobre uma das conseqüências mais instigantes dos novos tempos: o surgimento de uma “cultura das favelas e periferias”, que “destitui os tradicionais mediadores da cultura e passa de ’objeto’ a sujeito do discurso”.

Ela se expressa por meio de formas como música, teatro, dança, literatura, cinema; circula graças à popularização dos equipamentos digitais e à facilidade de duplicação de CDs, livros e música; “é contraponto à visão estereotipada das favelas como fábricas de morte e violência”. Feita a constatação, Ivana lança-se a duas perguntas: como dar suporte a estas novas redes sócio-culturais? Como articulá-las com a reestruturação produtiva, que tem por centro o trabalho imaterial, a produção, fora das grandes corporações, de conhecimento, informação, comunicação e arte.

Finalmente, um pequeno texto destaca a contribuição de Le Monde Diplomatique para a nova comunicação. Planeta Diplô conta a história mais recente de uma publicação que, sendo talvez uma das mais críticas à globalização neoliberal tornou-se o jornal mais globalizado do planeta. Em novembro de 2006, quando foi escrito o artigo, já eram 60 edições internacionais (hoje, são 66...), em 34 países e 25 idiomas. O texto explica que tal contradição é apenas aparente: há cada vez mais espaço, entre todas as sociedades, para quem se atreve a denunciar o “pensamento único”, e sustentar que “outro mundo é possível”. Ótima leitura.

Fonte: Le Monde Diplomatique - Brasil


Caminhos para uma comunicação democrática
128 páginas
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segunda-feira, 29 de setembro de 2008

IDEOLOGIA E UTOPIA: UMA DIFERENCIAÇÃO FUNDAMENTAL

Em um comentário no Blog Língua, de Aldo Nascimento, eu afirmei que a política é o campo da construção do contraditório. O que isso quer dizer?

Quer dizer que a lógica do embate de idéias que só existe na pluralidade de valores e concepções é fundamental para a vida pública. Para Platão e Aristóteles, a vida plena e a felicidade só poderiam ser alcançadas pelo exercício sistemático do raciocínio e da discussão. O caminho para esse exercício é o diálogo, isto é, a busca do valor essencial da vida só se daria no debate com a alteridade, com o outro.

Para Kant, a ação política é o fim último da realização da sociedade e da própria humanidade, não apenas dos filósofos (como defendia Sócrates), mas de todos os cidadãos. A política é a essência da ordem inscrita no Cosmos para a manutenção do equilíbrio entre razão individual e razão coletiva, entre espaço privado e espaço público, entre as valorações axiológicas pessoais e o equilíbrio da História Universal.

Mesmo os neokantianos, apesar das justificadas divergências entre as escolas de Baden e de Marburgo, jamais reformularam o conceito segundo o qual a razão individual é incapaz de realizar-se totalmente no indivíduo, originalmente defendido na segunda proposição da Idéia de uma História Universal de um Ponto de Vista Cosmopolita, do próprio Kant.

A tendência da política moderna, da qual o governo petista do Acre infelizmente faz parte, é substituir essa acepção ampla da política por outra: a política da concentração e manipulação do poder de um grupo sobre o todo social, como se fosse a própria quintessência da voz histórica.

Nesse aspecto, uma política fundada no diálogo contraditório, que apesar da contradição tem como objetivo alcançar a vida boa, a vida plena, é tida como ameaça a essa voz verdadeira e emancipatória. Uma voz que se autoprocolama a única representante da vida ética e da razão histórica kantiana (!).

De onde vem esse modo de pensar a política?

Vem da lógica da eficácia unilateral, do gerenciamento a-histórico, da filosofia burguesa do cidadão competente que se sobrepõe aos demais. Diferente da estética socrática, em que somente os filósofos poderiam compreender a essência da polis, e portanto agir de forma mais competente que os demais, a estética burguesa privatiza toda a política ao levar para a mesma a lógica do domínio por meio da concentração unilateral de poder - sua marca no campo econômico.

Curiosamente, a concentração unilateral de poder é a marca inequívoca dos principais regimes totalitários do século XX.

Como age essa estratégia, essencialmente antipolítica, na conquista da política?

Marginalizando dois conceitos fundamentais e necessários para a fundamentação do diálogo político: a utopia e a ideologia. Uma vez que os seres humanos são seres de paixões, de valores, de visões de mundo, a eliminação de qualquer vestígio de utopias é fundamental para que se funde a lógica da eficácia unilateral, a-histórica e privada.

Ao estabelecer como ideologias, isto é, como valores axiologicamente viciados (ou alucinações pessoais) determinadas idéias que lhe fazem frente, essa estética da eficácia insere-se, insidiosamente, no coração mesmo do processo político. E torna-se o câncer que aos poucos destruirá todos os esquemas da velha razão histórica (em oposição à razão individual) kantiana e neokantiana, substituindo-a pela concepção privada da vida pública.

O objetivo desse projeto, essencialmente totalitário, é que as idéias não mais sejam objetos de diálogo, mas inimigos a serem eliminados. Que a política não seja a construção social, mas um exercício de gerentes altamente especializados sobre a massa acéfala (ou a ser esclarecida, na versão "de esquerda"). Que a democracia torne-se, dentro ainda da aparência formal do aparelho democrático, uma ditadura civil.

Como diferenciar, portanto, os conceitos de ideologia e utopia?

Em seu livro Ideologia e Utopia, Karl Mannheim dedica-se a essa distinção. Ideologia seria o conjunto de concepções, idéias, representações, teorias, que se orientam para a estabilização, legitimação ou reprodução da ordem social vigente. Utopia, ao contrário, é o conjunto de idéias, representações e teorias que aspiram uma outra realidade, uma realidade ainda inexistente.

Em uma série de conferências realizadas em 1985, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/USP), o sociólogo brasileiro Michael Löwy tenta aprofundar essa diferenciação, propondo o termo "visão social de mundo".

Para Löwy, “visão social de mundo” é a soma de todos os valores, representações, idéias e orientações cognitivas que fundam e orientam as ações de um indivíduo e que podem ser de dois tipos:

1) Visões sociais ideológicas - Quando servissem para legitimar, justificar, defender ou manter uma ordem social vigente;

2) Visões sociais utópicas - Quando tivessem uma função crítica, negativa, subversiva, quando apontasse uma realidade ainda inexistente.

Em um livro chamado "Ideologias e Ciências Sociais", Michael Löwy conclui: "O ponto de vista do proletariado é mais amplo que o da burguesia", pela mesma razão que levou Kant a defender o aspecto supra-histórico da emancipação da razão humana: a formação de uma intersubjetividade livre, em contraposição à intersubjetividade burguesa fundada na lógica privada, filha do medo com o pavor...

O problema é que a formação da intersubjetividade livre é justamente o que ameaça um governo totalitário e apolítico. É, em essência, exatamente aquilo a ser destruído em uma política fundada na lógica da eficácia privada, uma vez que esta é necessariamente excludente e hierarquizante, alimentando-se da concentração de poder para maximizar a sua dominação pela eficácia, pela capacidade.

O poder justifica-se aí pelo próprio exercício do poder, uma vez que as vozes, mesmo proletárias, ao defender o retorno desse poder às mãos de seus mandatários históricos (os trabalhadores) são convidadas a "calar-se e bater palmas".

Ou então são chamadas a apresentar idéias novas para que o regime prove que a sua lógica da eficácia é de fato eficaz (um absurdo, evidentemente, uma vez que a crítica é justamente à estética privada, messiânica e totalitária, no espaço público).

Por essas razões, por defender um exclusivisimo salvífico, um endeusamento a-histórico, um messianismo suprapolítico, o autoproclamado Partido dos Trabalhadores (PT) deverá levar o atual prefeito de Rio Branco, Raimundo Angelim, a perder as eleições nesse ano em Rio Branco.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

SOBRE A INTERVENÇÃO MILITAR EM PANDO

O governo Evo Morales apostou pesado demais ao nomear um militar como interventor do Departamento de Pando.

Rafael Bandera Arce, apesar de ter prestado relevantes serviços à nação boliviana (ele era o encarregado do Setor de Defesa Civil do Departamento de Beni) e ter várias condecorações por bravura, algumas delas pelo seu desempenho em enchentes dramáticas naquela região que faz fronteira com o Brasil por Rondônia, não é a pessoa adequada para o cargo.

A política é a construção social da arte do contraditório. É por isso que segundo os seus inventores, Platão e Aristóteles, é somente na democracia que ela pode ser exercida.

Um militar é sempre um militar, um soldado treinado para cumprir ordens sem nada questionar. Nesse sentido, Rafael Arce mostrou-se sempre um excelente oficial. A última prova ele deu em sua primeira entrevista coletiva como Interventor, quando os repórteres lhe perguntaram sobre a possibilidade de retorno de Leopoldo Fernández.

Arce simplesmente girou nos calcanhares e deu as costas. Nada disse. Não retrucou. Não xingou. Não mentiu, nem dissimulou. Apenas foi embora, deixando os colegas da imprensa local e estrangeira a perguntar-se: "O que foi isso?"

Espero que essa intervenção dure de fato 90 dias, como prometeu o presidente Evo Morales.

Como socialista apóio a luta do povo boliviano e o esforço pela democratização de um país tão castigado, interna e externamente, por uma oligarquia político-econômica que produziu uma pobreza imensa em um país tão rico.

Mas como cidadão e democrata, acho intolerável a manutenção de um militar no poder. Com o histórico de golpes, "preventivos" ou não, da nossa América Latina, há um risco enorme inclusive para os trabalhadores daquele país.

Exatamente eles, a quem pertence todo o poder político, econômico e social, não podem ser culpabilizados por qualquer decisão equivocada.

Todo o poder aos soviéts!

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

ENTREVISTA COM SOBREVIVENTE DO MASSACRE EM PANDO

Em um testemunho dilacerante uma mulher indígena de 44 anos (a quem chamaremos Rosa por razões de segurança) conta os momentos de pavor que viveu ao escapar do massacre de camponeses no último dia 11 deste mês.

O genocídio, um dos fatos apavorantes das últimas décadas na história da Bolívia, ocorreu no povoado de Porvenir, proximidades da localidade de Tres Barracas. "Rosa" é uma líder rural da comunidade Santos Mercado, a mais distante de Pando. Entre lágrimas, ela diz que salvou-se "por milagre" ao jogar-se numa vala de esgoto a céu aberto, onde já havia outra mulher que a ocultou com sacolas, aros de pneus queimados e lixo.

A sobrevivente relatou ainda que os paramilitares atiravam nos pés e pernas das vítimas para descobrir quem era os líderes da marcha que se dirigia a Cobija. Os camponeses, segundo Rosa, não estavam armados.

Veja:


Como aconteceram os fatos que culminaram na luta sangrenta?

Nós saímos da comunidade rural e nos dirigíamos a uma manifestação pacífica em Cobija. Eles nos enfrentaram primeiramente às 2 horas da manhã e nós não quisemos reagir porque não estávamos armados. Já eles tinham bombas, foguetes, dinamites e lançaram tudo isso na gente. Assim, decidimos voltar para Puerto Rico. Só paramos um automóvel Pampa e tomamos as bombas de três pessoas que estavam dentro. Em Porvenir já nos encontraram duas caminhonetes lotadas de pessoas armadas com armas novinhas, metralhadoras, e com isso nos balearam. Isso por volta das 11 da manhã (quinta-feira) mais ou menos.

E vocês nesse momento se entregaram, escaparam, o que fizeram?

Muitos dos meus companheiros escaparam pela mata, eles (os assassinos) o seguiram pelo rio e lhes balearam como fossem animais.

Quem eram os assassinos? E a senhora, como salvou a sua vida, já que eles procuravam exatamente líderes rurais?

Todos eles trabalham no Governo, inclusive havia brasileiros entre o meio... Eu escapei porque me joguei em uma valeta e me cobri com lixo. Uma senhora (vizinha do lugar) me ajudou. Desse ponto eu vi tudo o que fizeram eles até as cinco da tarde (desde as 11 horas da manhã) estive aí na vala até que acabasse o tiroteio. Mas todos são funcionários do Governo, eu os conheço porque sempre viajei para Cobija e os via. Servidores do Governo, engenheiros, doutores etc.

Houve mulheres maltratadas e assassinadas?

Eles chicotearam as companheiras. Algumas se lançaram à água para cruzar o rio a nado e aí lhes deram tiros. Em seguida mataram as companheiras, algumas delas, grávidas.

Como foi a morte do engenheiro do Governo Departamental?

Esse engenheiro estava numa caminhonete vermelha que por chocar o caminhão onde nós éramos transportados, freou de repente e entrou numa vala comum. Esse engenheiro estava na carroceria, sentado, mas os assassinos para tentar nos incriminar lhe deram um tiro na cabeça, a sangue-frio. Foi isso o que aconteceu.

E a Polícia, como agiu? Tentou impedir que os enfrentamentos, enfim, o que fez?

Quando chegamos em Porvenir, a Polícia na tranca avisou que iria nos revistar para ver se encontravam armas. Aí respondemos: "Tudo bem, podem revistar porque não temos nada. A única coisa que temos são esses paus que agarramos para nos defender, porque eles estavam jogando bombas em nós". E contamos toda a situação. Dissemos: "Como já chegamos em Porvenir vamos dialogar, vamos conversar, companheiros". Nós estávamos parados no meio do sol quente. Tínhamos crianças, senhoras fatigadas, sufocadas que estavam sem café da manhã, nem nada. Nem água tínhamos tomado. Uma policial feminina veio para nos revistar e quando estávamos no meio dessa operação começamos a ouvir um tiroteio próximo. Os policiais fugiram todos. Nem mesmo disseram: "Alto aí!", nada disso. Eles fugiram e nos deixaram sozinhos.

Então a polícia não ficou com vocês, mas fugiu?

Sim, eles fugiram primeiro. Aí começou o massacre. Alguns de nós fomos baleados e vendo isso os companheiros fugiram por onde puderam. Alguns se jogaram no rio, pulando da ponte, mas os atiradores os alcançaram e largaram os balaços já das metralhadoras.

Como a senhora salvou-se disso tudo?

Eu me joguei numa valeta próxima. Havia uma poça de lama, onde também eram jogados alguns restos e detritos de uma oficina próxima. Por isso tinha vários pneus de caminhão, alguns já somente com aqueles rolos de arames queimados. Então eu me agarrei a isso e também com papel e lixo para me cobrir. Uma senhora, esposa do dono de uma dessas oficinas me ajudou a me disfarçar melhor, colocando sacolas velhas com mais lixo e pneus velhos sobre mim. A partir daí eu comecei a observar tudo o que aconteceu durante o tiroteio. Como eles pensaram que era só lixo, não acharam que tivesse alguém ali dentro. Por isso escapei. Mas ouvi tudo o que disseram e vi o que fizeram.

O objetivo deles era mesmo prender os líderes rurais?

Eles diziam assim: "Vamos pegar os dirigentes deles primeiro, eles são os cabeças!". E tinha ainda alguns brasileiros, que falavam: "Vamos matar de uma vez, rápido!" e então começavam a chicotear os companheiros. Chicoteavam e gritavam: "Fala, quem são vocês, de onde vêm, quem lhes trouxe, o governador lhe deu dinheiro, o prefeito [de Cobija, "Tiquitín Flores", aliado de Evo Morales] te deu dinheiro? Os outros diziam: "Não! Ninguém nos trouxe, nós viemos para outra coisa, não estamos nisso!" Aí eles comentavam entre si: "Não querem falar!", e davam tiros nos pés dos companheiros.

Se a senhora encontrasse o governador Leopoldo Fernández, o que lhe diria?

Que talvez seja pecado ser pobre ou camponês. Por que nos assassinaram assim, com tanto ódio? Essa seria a primeira coisa que eu poderia dizer a ele.

Por que a senhora participou da marcha?

Sou líder da minha comunidade rural, da última comunidade do município, na verdade. Caminhei muito por um lugar que sequer de bicicleta dá pra entrar. Tive que caminhar mais de 12 horas para chegar à minha comunidade. Desta vez, carreguei alguns mantimentos na costas e vim para cá. Sofro muito como mulher, mesmo carregando o meu alimento próprio alimento, pois a comunidade é distante e recém-criada. Além disso tenho 44 anos, oito filhos e sete enteados que criei. É para esses filhos que eu tenho que buscar o pão de cada dia.

Fonte: ABI


Comentário pessoal: Para comparar as declarações da sobrevivente com a versão dada pela imprensa local (leia-se: com a versão do governador Leopoldo Fernández) aos jornais locais, clique aqui.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

"LEO" ADMITE AÇÃO CONTRA CAMPONESES

O prefeito de Pando, Leopoldo Fernández, reconheceu perante o juiz de Instrução Penal, Williams Dávila, que ordenou aos funcionários da Prefeitura que se mobilizassem para frear a marcha de camponeses para a cidade de Cobija, no último dia 11.

Fernández disse que ao tomar conhecimento de uma marcha de camponeses se aproximando de Cobija ordenou ao Servicio Prefectural Departamental de Caminos, um órgão público:

- Vão e abram trincheiras na estrada, se não houver formas de pará-los, que abram trincheiras.

O juiz deixou claro que "o réu, na sua exposição, estabeleceu que tinha conhecimento do que ocorria dias antes e no mesmo 11 de setembro, quando se registraram as mortes de muitas pessoas, inclusive inocentes".

A investigação também confirmou que os veículos do Servicio Departamental de Caminos (Sedcam) foram identificados por vários sobreviventes durante as ações dos milicianos. O mesmo foi admitido pelos próprios milicianos, já que alguns foram presos.

O juiz acrescentou que devido ao estado de sítio o emprego desses veículos só poderia ser feito mediante ordem de autoridades federais.

Nesse sentido, disse que "não é que o réu tenha participado de forma pessoal nestes feitos, mas ele teve conhecimento de que esses veículos estavam levando funcionários do Governo para que fizessem frente aos camponeses e indígenas que tinham a intenção de chegar na cidade para protestar".

Dávila estabeleceu que trata-se de um delito previsto no artigo 133 do Código Penal, que assinala: "O que fizer parte, ou atuar a serviço, ou ainda colaborar com uma organização armada destinada a cometer delitos contra a segurança comum, a vida, a integridade corporal, a liberdade de livre locomoção ou a propriedade, com a finalidade de subverter a ordem Constitucional ou manter em estado de perigo, alarme ou pânico coletivo a população ou a um setor dela, será punido na forma da lei".

Com isso, concluiu que "esta é a ligação, a medida do grau de participação (de Fernández) ao entregar as caminhonetes e dizer 'Vão e que não deixem passar os camponeses!', como reconheceu o próprio réu".

Para o juiz, com esta atitude o governador pandino colaborou para que se pudesse inclusive realizar o enfrentamento, "apesar de assinalar que tentou apaziguar os ânimos e não chegar ao enfrentamento que posteriormente matou pessoas e deixou um estado de perigo e de pânico geral na cidade de Cobija".

"Para o subscrito Juiz não existem brancos, pretos, amarelos, loiros, nem funcionários de primeiro ou segundo nível, em absoluto pessoas de primeira ou segunda qualidade", esclareceu Dávila e determinou que a detenção preventiva de Fernández ocorresse na prisão de San Pedro, cidade de La Paz.

O juiz baseou-se também na acusação feita pelo promotor Félix Peralta, acerca da provável participação do governador. Fernández também responde outro a outro processo pelos crimes de assassinato, terrorismo e associação delituosa.

O promotor entregou ao juiz uma série de fotografias mostrando como camponeses e estudantes foram emboscados, torturados e crivados de balas por grupos armados. Entre os acusados foram identificados funcionários do Governo, do Serviço Departamental de Caminhos de Pando, integrantes do Comitê Cívico daquele departamento e também de pessoas com sotaque brasileiro.

O promotor Peralta Manuel Morales também apresentou armas de fogo e projéteis vazios de diferentes calibres - munição usada pelos grupos armados - como provas nos autos contra Fernández.

Entre as armas foram encontradas ainda três fuzis mauser, um fuzil FAL, rifles e revólveres, além de caixas de petardos e pedaços de pau manchados com sangue dos camponeses e indígenas massacrados pelos grupos armados.

O juiz Dávila concluiu que todos os elementos provam que tratou-se de um genocídio, impossível de se negar devido ao grande número de cadáveres e feridos identificados por fotografias, vídeos e laudos do IML.

Para o juiz os elementos apresentados são suficientes para provar o genocídio e manter a prisão.

"Agora, em relação à probabilidade de participação do imputado é necessário levar em conta que evidentemente ainda não estou julgando em definitivo, por isso falo de probabilidade de participação", disse Dávila.

Para ele, se o acusado é culpado ou inocente isso será esclarecido durante a investigação com a coleta de novos depoimentos e outros elementos do processo.

Às 20h45 desta quinta-feira o governador foi levado à prisão de San Pedro por ordem do juiz Dávila. A detenção preventiva fundamenta-se nas acusações de terrorismo, associação delituosa e assassinato em massa (genocídio).

O Ministério Público foi representado pelos promotores Félix Peralta e Manuel Morales.

A acusação foi feita pelos advogados Mary Carrasco e Sergio Rodríguez, que representaram os familiares das seguintes vítimas do massacre de Porvenir: Jhonny Cori Sarsuri, Wilson Castillo Quispe e Alfonso Cruz (estudantes) e do falecido Ramiro Tiñini Alvarado.

A audiência, que durou perto de cinco horas em um escritório da Academia Nacional de Policiais (Anapol), aconteceu sob rígido esquema de segurança. As organizações sociais e os familiares das vítimas cercaram o instituto policial pedindo 30 anos de pena para Fernández na prisão de segurança máxima de Chonchocoro.

Ao tomar conhecimento da decisão do juiz os manifestantes se dirigiram à prisão de San Pedro, no centro de La Paz, para conferir a transferência do governador à instituição.

Fonte: ABI

CADÊ A PNAD?

Nem jornais impressos, nem agências virtuais, nem mesmo os blogs acreanos divulgaram uma linha sobre a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD), a segunda principal pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), publicada ontem.

Até o jornalista Adailson Oliveira, que geralmente faz ótimos trabalhos com números e estatísticas, deixou muito a desejar em sua matéria de ontem sobre a pesquisa.

Pudera. O calhamaço de 334 páginas - pequeno para os padrões do IBGE - é difícil de ser localizado e baixado para o computador. E mesmo assim precisa ser lido, analisado e comparado com pesquisas anteriores para se chegar ao que realmente interessa numa matéria jornalística: apontar tendências.

Ou seja: mexer com uma pesquisa com estatísticas exige tempo.

Por que isso ocorre, pois, apesar da mudança do fuso horário, a jornada de trabalho do jornalista continua a mesma?

Para responder a essa questão precisamos entender o modo de produção do jornalismo acreano. Nesse sentido, rádios, TVs e impressos se assemelham muito.

Funciona assim: o repórter costuma sair da redação com pautas (temas de reportagens) definidas pela editoria. Geralmente elas dizem respeito à cobertura de algum "ato oficial" do governo, das prefeituras, do legislativo ou do judiciário, exatamente as instituições das quais os jornais dependem economicamente.

Evidentemente a cobertura de qualquer ação do poder público pode e deve ser feita pela imprensa. Antiético é que o repórter já tenha definida a orientação do que vai produzir, isto é, a idéia de que a matéria vai "bater" ou "elogiar" antes mesmo dela ser produzida.

Ocorre que essa valoração não é definida pelo próprio repórter. É definida pelo departamento financeiro das empresas de comunicação. É lá que notícias "negativas" são aplainadas ou mesmo eliminadas - caso da PNAD. E notícias "positivas" são supervalorizadas, algumas até de forma constrangedora...

Essa "estética noticiosa" tem duas conseqüências drásticas. A primeira é que o profissional de imprensa, cuja consciência crítica é diariamente desestimulada em nome da sua sobrevivência pessoal e profissional, acaba por assimilar esse comportamento e produzir cada vez mais notícias "em sintonia" com os interesses da empresa - e não com os interesses da população.

A segunda conseqüência é que esse tipo de jornalismo corrói aos poucos, sob uma aparência sórdida de legalidade e profissionalismo, qualquer consciência crítica sobre os problemas sociais, estuprando ainda a liberdade de imprensa e de debate que são as bases de uma sociedade democrática.

É por isso que matérias com os assustadores índices que contém a PNAD, que mais tarde vou publicar aqui, não saíram nos jornais.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

VÍDEO MOSTRA MASSACRE EM PANDO

O vídeo abaixo foi divulgado pela emissora boliviana Canal 7. Ele mostra como paramilitares e pistoleiros - segundo os sobreviventes - a serviço do governador de Pando, Leopoldo Fernández, consumaram o massacre de camponeses indefesos no rio Tahumanu, na fronteira com o Brasil pelo Acre.

Dois dias depois um corpo foi resgatado no lado brasileiro. O programa Gazeta Alerta, de Rio Branco, mostrou a operação do IML acreano e o apresentador Edvaldo Souza chegou a cogitar: "Talvez seja uma vítima da violência que ocorre nesse momento em Pando".

É um profeta...

Clique aqui para ouvir outros depoimentos de camponeses sobre o ataque. O áudio está em mp3 e foi disponibilizado pela Agencia Boliviana de Información (ABI).

Ainda segundo a ABI, ontem a Sala Penal Tercera de la Corte Superior de Distrito de La Paz declarou improcedente um pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Fernández. À audiência compareceram familiares dos estudantes Mary Carrasco e Sergio Rodríguez, que morreram no confronto. Elas pediram a continuidade da prisão.

Mas as atenções na Bolívia estão voltadas mesmo para um centro de convenções do vilarejo de Chiquicollo, a 10 quilômetros do centro de Cochabamba. É lá que estão acontecendo, desde as 9 horas da manhã de hoje, as negociações entre o governo central e os governadores dos estados separatistas. A reunião foi convocada pelo próprio Morales.

"O Presidente pediu que o diálogo não seja interrompido. Que trabalhemos aqui estes quatro dias, ou cinco, se for necessário, até conseguir acordos para que o país tenha resultados favoráveis desse encontro", anunciou o porta-voz da Presidência da República, Iván Canelas, à Radio Erbol.

Clique aqui para ter acesso a uma lista de rádios da Bolívia com transmissão pela internet.


quarta-feira, 17 de setembro de 2008

PELA ESTATIZAÇÃO DOS JORNAIS ACREANOS





De tanto conviver com o ufanismo na política, com a concentração de renda na economia e com a segregação das classes sociais mais numerosas, o jornalismo acreano tornou-se o reflexo do ambiente em que é produzido.

Um jornalismo vertical.

Observe as capas de hoje da TRIBUNA, da GAZETA, do RIO BRANCO e do PÁGINA 20. Além de várias matérias e até fotografias em comum, o que mais encontramos? Encontramos notícias em que instituições e seus representantes falam ao povo. Que determinam esquemas morais. Que ditam normas, valores, idéias.

Que usam os jornais para reforçar o seu próprio poder de mando.

O jornalismo impresso do Acre é conseqüência óbvia do seu modo de produção, da lógica clientelista em que sobrevive. De tanto depender das instituições necessárias a uma sociedade verticalizada e estratificada em classes sociais segregadas ou segregadoras, os jornais locais produziram um jornalismo que não passa de mero anunciador de ações de um Poder Instituído que administra para o "povo gado", como canta Zé Ramalho.

Esses papéis sociais são reforçados quando alguém "sem representativade" política somente aparece nas páginas dos jornais em situações desfavoráveis, ridículas ou degradantes.

Uma tendência mais recente iniciada pelo PÁGINA 20 (uma espécie de "jornalismo positivo") retrata tais pessoas de forma piegas, ufanista e até paternalista, com frases de efeito como "exemplo de vida" (ou "de superação"), "volta por cima" e similares.

Isso nada revela senão a fé cega em um modelo de sociedade que se alimenta do individualismo, da lógica da eficácia privada e da produção de miséria em escala industrial para concentrar cada vez mais a riqueza produzida.

É uma outra forma de estratificação, de servilismo.

Ao falar de "superação" do atual "estado de coisas", ao defender as benesses do progresso e da civilização, os jornais, empresas que são, elegem justamente o modelo mais segregador e vertical possível: o capitalismo.

Ocorre que no capitalismo esse "desenvolvimento" baseia-se na apropriação privada do trabalho alheio. A produção de riquezas é social, claro, mas a apropriação é privada. Vai para uma parcela mínima da sociedade (uma classe social, na verdade): os patrões. É por isso que a produção de miséria, de violência e de exclusão social são as marcas de uma economia de mercado em qualquer país, em qualquer época.

Como começar a mudar esse estado de coisas? Como criar um jornalismo horizontal, participativo e menos dependente das instituições, sejam públicas ou privadas?

Na minha opinião jornais não deveriam ser privados, mas também não podem ser estatais. Empresas jornalísticas devem ser públicas, mantidas com recursos sociais e independentes da burocracia estatal. Dessa forma o poder público assumiria formalmente o patrocínio que já ocorre na maior parte dessas empresas.

Do jeito que está é uma imoralidade. E não pode continuar.

Por isso, os jornalistas comprometidos com a qualidade do jornalismo devem começar a defender a estatização dos jornais acreanos, com gestão popular com os próprios trabalhadores dessas empresas por meio do Sindicato dos Jornalistas do Acre (SINJAC).

Estatização já!

DOS REFUGIADOS EM BRASILÉIA

Demorei a comentar esse tema porque queria certificar-me de um detalhe e para isso era necessário esperar que outros blogueiros e também os jornais locais o fizessem antes.

Brasiléia é o principal refúgio dos manifestantes separatistas que temem ser presos pelo Exército boliviano. Alguns foram vítimas de agressões truculentas durante os confrontos.

Certo, isso todo mundo já sabe.

O que muitos não sabem, pois os jornais preferem não divulgar, é que a multidão de bolivianos que fugiu para a zona rural de Brasiléia não é formada apenas por separatistas.

Há "campesinos" (camponeses) entre eles.

E mais: em declarações à Red Erbol, o cônsul da Bolívia em Brasiléia, José Luís Méndez, afirmou:

“Os camponeses dizem que continuam sendo perseguidos e eu também digo isso porque temos medo (aqui no Consulado) porque alguns grupos têm feito mobilizações à noite e de madrugada, e também fazem chamadas telefônicas anônimas. Por isso pedimos mais segurança às autoridades brasileiras e fomos atendidos”.

Clique aqui para saber o "outro lado" dessa história.

O grupo de bolivianos que saiu no Jornal Nacional é formado por famílias de Cobija que participaram das manifestações contra o governo Morales. Trata-se de um direito político, obviamente, que só não pode ser exercido na vigência de estado de sítio (justamente o que vigorava nesses protestos, o que acabou ensejando a ocupação do departamento pelo Exército e a prisão do governador Leopoldo Fernández).

Por isso, há três equívocos na notícia global.

A primeira é que nem todos os refugiados são separatistas. A segunda é que não são "milhares de pessoas", como disse William Bonner. E a terceira é que o uso da força pelo Exército deu-se em um contexto de estado de sítio - embora nem de longe isso justifique o uso da força contra civis.

Clique aqui para ver uma matéria do jornal cruceño El Deber sobre os 400 refugiados separatistas de Brasiléia. Eles denunciam várias atrocidades e agressões - que na minha opinião deveriam ser investigadas e esclarecidas o mais rápido possível.

Seria ótimo para nós que a imprensa tivesse mais cuidado nessas coberturas. A situação política da Bolívia faz parte de um xadrez complicado, em que os dois lados usam todas as estratégias possíveis para "ganhar" a opinião pública.

Como no jornalismo não existe imparcialidade, resta ao repórter escolher o lado mais fraco: o lado dos trabalhadores.

A foto é da FM Bolivia.

IMAGEM DO DIA




O governador de Tarija, Mario Cossío, entrega ao cardeal Julio Terrazas cópia de um pré-acordo com o governo Morales que lançará as bases do processo de pacificação na Bolívia. A reunião para o acordo bilateral foi convocada pelo próprio presidente e acontece amanhã.

A foto é do jornal boliviano El Deber.

AINDA SOBRE A BOLÍVIA

O jornal boliviano El Deber, de Santa Cruz de La Sierra, acaba de desmentir uma informação dada pelo senador boliviano Paulo Bravo ao programa Gazeta Alerta, daqui de Rio Branco.

Bravo, que está refugiado em Brasiléia, afirmou que o governo Morales pensa em nomear um militar para ocupar a vaga do governador Leopoldo Fernández, preso ontem por violação do estado de sítio em Pando.

De acordo com a matéria ainda não se sabe quem será o sucessor, mas os próprios militares negam a possibilidade de ocupar o cargo.

Concordo com os militares. É ilegal, imoral e antidemocrática a nomeação de oficiais das Forças Armadas para cargos civis, mesmo em épocas de exaltação política. É de triste lembrança na memória política brasileira a última intervenção militar na nossa "democracia".

Evo Morales, indígena que é, deveria estimular a administração do Estado pela própria população, em conselhos de trabalhadores organizados com decisões tomadas coletivamente em assembléias.

Sem violência entre irmãos, sem sangue derramado, Pando poderia assim tornar-se o primeiro Estado realmente socialista da Bolívia.

E Leopoldo Fernández?

"Fernández também deve enfrentar uma investigação aberta pela Fiscalía General, que o acusou de promover os incidentes da semana passada, que deixaram um saldo de pelo menos 18 mortos, entre eles um civil e um recruta, várias dezenas de feridos e 106 desaparecidos", lembra a matéria assinada pelo jornalista Gustavo Ondarza.

CAMPANHA ESQUISITA

Essa campanha eleitoral para prefeito de Rio Branco inovou de um jeito esquisito.

As emissoras de TV eliminaram, sem qualquer explicação ou satisfação prévia, os debates entre os candidatos ao cargo majoritário.

Há entrevistas com os jornalistas, e só. Nelas, um ou vários repórteres fazem perguntas a um único candidato.

Estranho...

Por que essa mudança, hein?

terça-feira, 16 de setembro de 2008

LEOPOLDO É PRESO

O governador de Pando, Leopoldo Fernández, foi preso por volta das 11h15 de hoje (hora Acre) sob acusação de violar o Estado de Sítio na Bolívia. Outras 10 lideranças políticas pandinas também foram presas, informa a Red Erbol.

Contra o governador pesa ainda a acusação de genocídio, em um processo movido pela Fiscalía General de La Republica e que repercutiu hoje em todos os jornais bolivianos.

As investigações que antecederam o processo começaram no último dia 11, data do massacre em que 30 pessoas (28 delas, camponesas) foram mortas em ações de milicianos organizados pelo Comitê Cívico de Pando. O anúncio formal da abertura do processo deu-se ontem.


Clique aqui para saber mais (em espanhol).

A BOLÍVIA E A BARRIGA DA TRIBUNA

A agência boliviana Red Erbol acaba de disponibilizar em seu site relatos das vítimas do massacre ocorrido no dia 11 no Departamento de Pando.

Por sua vez, a edição de hoje do diário acreano A TRIBUNA (des)informa: "Conforme foi noticiado pela Rede Globo e pelas Agâncias (sic) de Notícias, (sic) por voltas das 14h20 em rede nacional (sic), o governador de Pando, Leopoldo Fernandez, não está foragido e não existe nenhuma (sic) diligência militar para detê-lo."

É uma "barriga" (nome dado no jargão jornalístico a notícias equivocadas).

A Fiscalía General de La Republica (órgão boliviano similar à nossa Procuradoria Geral da República) indiciou Fernández e outros pelo crime de genocídio, baseando-se principalmente no uso de metralhadoras e fuzis por milicianos nos atentados do dia 11.

Acontece que essas armas (veja aqui) foram raptadas de um avião das Forças Armadas da Bolívia por integrantes do Comitê Cívico de Pando, entidade separatista liderada de forma extra-oficial por Fernández.

Para ver o comunicado oficial de abertura do processo penal no site da Fiscalía, clique aqui.

A mesma notícia repercutiu hoje nos jornais bolivianos La Razón, Los Tiempos, FM Bolivia e outros.

Em tempo: o dono do jornal A TRIBUNA, Eli Assem de Carvalho, foi um dos principais prestadores de serviços no setor de material gráfico e de impressos durante a campanha eleitoral que alçou Leopoldo Fernández ao cargo de governador de Pando.

Será que uma coisa tem a ver com a outra?

Deixo a resposta para a imaginação de vocês.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

LEOPOLDO FERNÁNDEZ PROCESSADO POR GENOCÍDIO

Promotor geral abriu processo contra o governador de Pando, acusando-o de promover massacre de camponeses, no dia 11
Promotor geral abriu processo contra Leopoldo Fernández, acusando-o de promover massacre de camponeses, no dia 11

O Promotor Geral da República, Mario Uribe, acusou formalmente, nesta segunda-feira (15), o governador do departamento de Pando, Leopoldo Fernández, de promover um genocídio em forma de massacre sangrento.

No dia 11, na localidade de El Porvenir, funcionários do governo departamental interceptaram, a balas, uma marcha de camponeses que se dirigia à capital Cobija, para se manifestarem contra Fernández.

Como conseqüência, já se fala em 30 mortos (28 deles, camponeses).

Uribe, em coletiva de imprensa, assinalou que o processo penal contra o governador de Pando inclui, também, o ex-prefeito de Cobija, Miguel Becerra, e o senador suplente do partido Unidad Nacional (UM), Abraham Cuellar.

Algumas horas antes, efetivos das Forças Armadas confiscaram armas em poder de civis – dez deles foram detidos, suspeitos de participarem do massacre do dia 11. Entre o arsenal, estavam fuzis, rifles, revólveres e uma metralhadora.


Fonte: Agência Brasil de Fato

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

EUA PREPARAM TERRENO PARA INTERVENÇÃO ARMADA

Os Estados Unidos estão preparando o terreno para uma intervenção armada na América Latina. Washington parece ter chegado à conclusão de que o controle dos recursos naturais na região, exercido através de terceiros em países como o Brasil, exigirá um confronto direto com o governo de Hugo Chávez.

Como se sabe, os Estados Unidos ajudaram a patrocinar o golpe de estado que, por algumas horas, afastou Hugo Chávez do poder em 2002.

Através do National Endownment for Democracy, o NED, o governo dos Estados Unidos continua a financiar atividades de "promoção da democracia" em países como a Venezuela e a Bolívia.

O NED, criado durante o governo de Ronald Reagan, assumiu atividades civis antes delegadas à Central de Inteligência Americana (CIA). Washington considera que essas atividades de "fortalecimento da sociedade civil" são mais eficazes que ações clandestinas.

O primeiro teste bem sucedido da estratégia do NED se deu com a derrota eleitoral dos sandinistas na Nicarágua diante de uma coalizão patrocinada pelos Estados Unidos e liderada por Violeta Chamorro, em 1990. A ação está documentada no livro A Faustian Bargain, de William Robinson.

O NED funciona como um canal através do qual dinheiro público dos Estados Unidos financia atividades desenvolvidas por entidades ligadas aos empresários, aos sindicatos e aos dois principais partidos estadunidenses, o Democrata e o Republicano. Isso garante apoio bipartidário no Congresso.

O NED teve atuação importante na Sérvia, na Geórgia, na Bielorrússia, na Rússia, na Ucrânia e em vários outros países, sempre promovendo grupos políticos da sociedade civil que faziam avançar os interesses dos Estados Unidos.

O dinheiro é aplicado em monitoramento de eleições, pesquisas eleitorais e treinamento de novas lideranças políticas.

Aqui há um artigo em inglês que dá uma visão geral sobre a chamada "democracy assistance".

A decisão do governo Bush de formalizar a acusação contra dois integrantes do alto escalão do governo Chávez, que acusa de apoio ao narcoterrorismo, abre espaço para justificar uma intervenção militar. Não vai acontecer amanhã. É uma política de estado, não de governo, cuja implementação depende da conjuntura política internacional e dos conflitos no Iraque e no Afeganistão.

Os Estados Unidos apoiaram o ataque da Colômbia ao acampamento das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) no Equador, o que abriu espaço para regionalizar o conflito e justificar a flexibilização das fronteiras.

Tanto o democrata Barack Obama quanto o republicano John McCain adotam o apoio à Colômbia em sua plataforma eleitoral, com endosso a ações militares preventivas com a justificativa de "combate ao terrorismo".

O controle das reservas petrolíferas da bacia do Orinoco, na Venezuela, e do gás natural boliviano são os objetivos de longo prazo dos Estados Unidos.

O governo que precedeu o de Evo Morales, de Gonzalo Sánchez de Lozada, caiu por pretender exportar gás boliviano para os Estados Unidos em navios através do Chile. A campanha eleitoral de Lozada foi magistralmente retratada no documentário Our Brand is Crisis.

Na Venezuela, Hugo Chávez foi brevemente derrubado logo depois de trocar a direção da PDVSA, a gigante estatal que sempre foi administrada atendendo aos interesses externos dos Estados Unidos.


Fonte: Site Vi o Mundo, do repórter Carlos Azenha.

AS VEIAS ABERTAS DA BOLÍVIA

Qualquer pessoa é criminosa quando promove uma guerra evitável, e também o é quando não promove uma guerra inevitável. (José Marti)



A Bolívia arde, inflama o desejo de mudanças seculares, de reconhecimento dos direitos indígenas por seu representante legitimamente eleito e reconhecido pelo referendo passado, Evo Morales.


Um presidente que veio para reparar as tragédias sofridas pelos indígenas ao longo dos anos, para ser referência em toda a América Latina destroçada pela espada espanhola e americana ao longo de décadas. Que veio para estancar as veias abertas que Galeano denunciou ao mundo - somente na Bolívia foram 8 milhões de índios, um holocausto esquecido nos livros de história.


Os mesmos que assassinaram Guevara, Vitor Jara, que mataram milhares no Chile, no Paraguai, os mesmos que apoiaram a ditadura brasileira, que derrubaram governos legítimos como Allende (Chile), Arbenz (Guatemala) agora querem desestabilizar o governo de Morales, um governo que quer o lucro de seus recursos naturais para os menos favorecidos e não para as mãos de poucos fazendeiros como sempre foi.


Vivemos um momento único, um momento tão esperado por Bolívar, Guevara e outros tantos que deram suas vidas para um dia ver uma América Latina unida, justa e igualitária. Os vários governos de esquerda que sucessivamente se elegem pelas mãos do povo são demonstrações do cansaço do povo latino das décadas de servidão e domínio imperialista.


A Bolívia arde.


Manter Evo Morales no poder, além de uma reparação histórica, é um dever moral de uma era nova que está nascendo em nossa América Maiúscula, como denominava Guevara.


A foto é da Agência Reuters.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

A FIGURA DO GESTOR COMPETENTE

A grande marca nas eleições para prefeito de Rio Branco em 2008 é a pasteurização da vida política. Não há políticos, há gestores. Não há candidatos, há administradores.

Como se disputassem vagas em algum concurso público os candidatos levam para a política o discurso e a lógica empresariais, e, mal dominando a sua posição francamente contrária a uma política de fato pública, manifestam abertamente todo o elitismo e a hierarquização dos quais dependem para se manter no poder.

Esse fenômeno mostra o poder das ideologias sobre a prática. Ao defender a figura do político-gerente, a imprensa e mesmo a classe política acabam traindo a lei da administração pública como algo próprio da vida... pública!

O pior é que a figura do político-especialista é um contra-senso, pois esses políticos e até mesmo os que os elegem sabem que os trâmites e processos da política não se dão por diplomas. É necessária uma rede muito bem urdida de trâmites sociais - portanto, coletivos, não privados - e ainda de delegação de responsabilidades para que a tal democracia representativa saia do papel (o que nem sempre acontece).

Essa invasão do público pelo privado tenta ocultar justamente esse aspecto coletivo da política, fazendo crer que questões sociais não podem ser resolvidas socialmente, mas por alguma alma iluminada, messiânica e - caso de Rio Branco nessas eleições - paternalista.

Herança ignóbil da época dos coronéis de barranco!

Um recado: gerentes competentes são necessários às empresas devido à lei de maximização de lucros inerente ao Capitalismo. Como uma empresa, qualquer que seja, é fundada na exploração do trabalho humano, segue-se que administradores de confiança são fundamentais para certificar-se da efetividade dessa exploração.

Qual o estrago dessa ideologia na política?

A falsa idéia de que "política não é para amadores" aumenta a distância entre eleitos e cidadãos. Com isso a democracia representativa fica mais próxima daquilo a que ela efetivamente se propõe: tornar-se cada vez mais representativa e menos democrática.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

GOLPE DE ESTADO EM ANDAMENTO NA BOLÍVIA

Em uma entrevista coletiva concedida nesta terça-feira (09.09) a vários canais de comunicação da Bolívia, o ministro de Interior do governo Evo Morales, Alfredo Rada, respondeu à pergunta que nenhum repórter fez até agora, esta:

- Por que os "comitês cívicos" agem sempre sincronizados nos departamentos?

O ministro - se - respondeu:

- O interesse dos comitês, que são formados pelo agrupamento de grandes empresários de cada departamento, é promover um golpe de Estado. Por isso agem de forma sincronizada. É por isso que eles se acham no direito de espancar, fechar prédios públicos, seqüestrar, enfim, fazer o que for necessário para colocar a população contra as instituições.

Nesta terça-feira parte da imprensa acreana mostrou mais uma dessas ações do Comitê Cívico de Pando, que não apenas invadiu o aeroporto como impediu o seu funcionamento por várias horas. E mais: seqüestrou um avião do Exército Boliviano e dele furtou armas, munições e outros suprimentos militares.

Para que o leitor tenha a dimensão da gravidade do que isso significa, é como se o governador Binho Marques e os empresários locais se unissem e fizessem o mesmo a uma aeronave do Exército Brasileiro.

Por que um comitê supostamente cívico estocaria armas e munições de uso exclusivo do Exército? Com que intenção?

Que tipo de civismo pode-se esperar quando os cívicos são justamente os integrantes das velhas oligarquias que sempre mandaram na Bolívia?

Veja mais informações aqui.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

QUEM AJUDA?

A maison ao lado vale R$ 30 mil, segundo a declaração de bens que o deputado estadual Nogueira Lima (DEM) entregou à Justiça Eleitoral nesse ano.

N. Lima ("Delinho", para os mais íntimos) é candidato a vice-prefeito de Rio Branco na chapa de Tião Bocalom (PSDB).

A declaração está disponível no site da ONG Transparência Brasil. Confira clicando aqui.

Alguém se habilita a oferecer R$ 50 mil no imóvel? N. Lima deve estar precisando, já que o patrimônio pessoal dele vem caindo desde 2006...

Interessados, vejam mais fotos clicando aqui.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

OBEDECER É MORRER

Obedecer é morrer. Cada instante em que o homem se submete a uma vontade estranha é um instante que na sua própria vida ele elimina.

Quando um indivíduo se vê constrangido a efetuar um ato contrário ao seu desejo ou impedido de agir de acordo com a sua necessidade, deixa assim de viver a sua vida pessoal; ao mesmo tempo que o homem que dá ordens aumenta a sua dominação da vida, sugada à energia dos que se lhe submetem, aquele que obedece aniquila-se, vê-se absorvido por uma personalidade que lhe é estranha, passando a ser apenas força mecânica, ferramenta ao serviço de um dono.

Quando se trata da autoridade exercida por um homem sobre outros homens, por um soberano despótico sobre os súditos, por um patrão sobre os empregados, por um senhor sobre os criados, imediatamente se percebe que esta personalidade emprega a vida dos que lhe estão submetidos para dar satisfação aos seus prazeres, às suas necessidades ou aos seus interesses; ou seja, para melhorar e ampliar a sua vida pessoal em prejuízo da deles.

Aquilo que em geral não se percebe tão facilmente é a nefasta influência, em tudo isto, das autoridades de ordem abstrata: as idéias, os mitos religiosos ou de outro género, os costumes, etc. E no entanto todas as manifestações exteriores de autoridade têm origem numa autoridade mental. Nenhuma autoridade material, seja ela a das leis ou a dos indivíduos, contém atualmente força e razão em si. Nenhuma se exerce realmente por si mesma, todas se baseiam em idéias.



Alexandra David-Néel

sábado, 6 de setembro de 2008

O BOM SAMARITANO

O deputado estadual Nogueira Lima (DEM), vice-candidato à prefeitura de Rio Branco na chapa de Tião Bocalom (PSDB), é mesmo um santo homem.

D
e acordo com a ONG Transparência Brasil o patrimônio pessoal do candidato vem caindo a cada eleição.

Dos R$ 688.400 que Lima declarou em 2006 à Justiça Eleitoral restam hoje "apenas" R$ 299.046.

Estranho, pois em 2006 o major-candidato "doou" R$ 52.584 a si mesmo, isto é, aplicou dinheiro na própria candidatura. E venceu!

Mesmo assim, dois anos depois está mais pobre.

Curioso, não? "Delinho", como é mais conhecido, é deputado estadual desde 1999 e major da reserva remunerada da Polícia Militar.

Portanto, pega uma grana boa!

Seria o deputado um dos sócios da igreja-empresa do missionário R.R. Soares?

Ah, sim! Ainda segundo a Transparência Brasil, "Delinho" financiou parte das campanhas dos atuais vereadores Juracy Nogueira (Rio Branco) e Manoel Nogueira (Bujari) em 2004.

Quantos "nogueiras"!

Pois é, ambos venceram. E até 2006 o patrimônio declarado do "Delinho" só fez crescer...

Como diria Cid Moreira: - Mistério, Mister M...!


Clique aqui para acessar o estudo completo.

A foto é do site da Assembléia Legislativa do Estado do Acre (Aleac).

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

DIA DA AMAZÔNIA

Mesmo sem esconder dados sobre o desmatamento da Amazônia, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) tem conseguido obter manchetes menos constrangedoras e, em muitos casos, até mesmo confortáveis para o governo.

Em busca de fatos novos para os títulos e lides (primeiros parágrafos) de suas reportagens, grande parte da imprensa têm passado uma imagem otimista e que não corresponde à realidade da extensão da devastação.

Várias matérias publicadas repetem o mesmo engano que vem sendo cometido há meses, que consiste em se basear nos dados mensais do sistema de detecção de desmatamentos em tempo real por satélites, que são úteis para orientar ações de fiscalização, mas não mostram a extensão total da devastação, que só é possível por meio da análise de períodos mais amplos.

Neste sábado, poucos veículos escaparam dessa interpretação mais confortável para o governo. Felizmente, entre eles estão jornais de grande alcance, como a Folha de S. Paulo, com a chamada de capa “Desmatamento na Amazônia cresce após 3 anos de queda” e a reportagem “Desmate na Amazônia subiu 64% em um ano, avalia Inpe”, de Marta Salomon, e O Estado de S. Paulo, com a chamada “Devastação da Amazônia cresce 64% em um ano” e a matéria “Desmatamento cresce 64% em 1 ano”, de Herton Escobar.

Por outro lado, não foram poucas as chamadas, títulos e lides (primeiros parágrafos de reportagens) que enfatizaram outro dado, que foi o da redução de 62% do desmatamento de julho deste ano em relação a junho, repetindo o enfoque da matéria “Desmatamento da Amazônia tem queda de 62% em julho”, publicada ontem no portal do MMA.


Manchetes otimistas

No mês passado foi a mesma coisa. A maior parte dos veículos de comunicação titulou suas chamadas de capa e suas reportagens em função dos índices de desmatamento de junho, que acusou redução da taxa de 20% em relação ao mês anterior e de 38% em relação a junho de 2007, na mesma linha da matéria “Ações do MMA pressionam queda da taxa de desmatamento na Amazônia”, publicada em 29/07/2008 no mesmo portal.

Desde o final de 2007, quando foi constatada a tendência de grande aumento da taxa anual de desmatamento da Floresta Amazônica brasileira para o período de 2007 a 2008, a atenção da imprensa e de ONGs passou a se concentrar nos índices mensais do sistema Deter (Desmatamento em Tempo Real).

Esse processo teve um efeito inegavelmente positivo, pois levou o Governo Federal a melhorar e a intensificar as ações de fiscalização. No entanto, esses dados não são adequados para determinar a extensão total da devastação, pois muitas das imagens de satélites são prejudicadas por nuvens.

As avaliações mais precisas se baseiam em períodos anuais e são feitas pelo sistema Prodes (Monitoramento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite). Os dois projetos são desenvolvidos pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), de São José dos Campos (SP), que é vinculado ao MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia).

Embora o próprio MMA tenha reiteradamente esclarecido o caráter parcial dos dados, as informações de seus comunicados são hierarquizadas de modo a enfatizar as reduções nas taxas de desmatamento apresentados mensalmente pelo Deter.

Em outras, palavras, ninguém pode acusar o ministro Carlos Minc de estar escondendo dados, principalmente em suas entrevistas coletivas. Quem está bobeando é grande parte da imprensa, que tem avançado sem discernimento sobre a isca que lhe é oferecida.


Matéria completa no blog Laudas Críticas, do jornalista Maurício Tuffani.

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Comentário meu: curiosamente nenhum jornal trouxe hoje, Dia da Amazônia, qualquer tendência de queda (ou de "incremento das taxas de queda", como preferem os técnicos do Imac) do desmatamento no Acre.

Farei a comparação dos dados anuais assim que melhorar da gripe. Até lá, sugiro uma olhada no excelente blog do Tuffani. Abraços!

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

NOTÍCIA E CONSCIÊNCIA DE CLASSE

Vejamos o tratamento dado pelos jornais impressos de Rio Branco a dois textos: um press-release enviado pela Assessoria de Imprensa da Federação das Indústrias do Estado do Acre (FIEAC) e uma notícia da Agência de Notícias do Acre, do Governo do Estado.

Por que o texto do governo não é um press-release? Porque ele foi "chupinhado" - como diz minha ex-editora-chefe - do site do governo. O "chupinhador" tascou-lhe o velho Ctrl+C, Ctrl+V, que é bom que se diga, eu mesmo usei e muito durante minhas passagens pela editoria da TRIBUNA.

É uma prática comum, aliás. E totalmente legal quando o jornal publica a fonte que "chupinhou".

Voltemos aos textos. Primeiro, lembro que ambos foram escritos e disponibilizados nesta quarta-feira, 03.09, um dia antes da publicação (hoje). E foram originalmente publicados em seus respectivos sites:

- Hidrelétrica de Jirau vai gerar 10 mil empregos (link para a notícia original no site da FIEAC).

- Binho Marques debate investimentos estruturantes com Fiemg e Camargo Corrêa (link para a notícia original no site da Agência de Notícias do Acre).


Agora vamos conferir os jornais, lembrando que as observações a seguir referem-se aos textos publicados nos sites. Por várias razões, alguns veículos omitem na internet alguns textos que saem na edição impressa (principalmente nas seções de Nacional e Internacional):

A GAZETA: Publicou na íntegra, sem crédito de origem ou de autoria, o texto da Agência de Notícias do Acre. Confira:

- Governador Binho debate investimentos estruturantes com Fiemg e Camargo Corrêa


A TRIBUNA: Publicou na íntegra, com crédito de origem, os dois textos na mesma página. Confira:

- Binho debate obras de grande impacto


O RIO BRANCO: Publicou na íntegra, sem crédito de origem, o texto da Agência de Notícias do Acre. Confira:

- Binho debate investimentos estruturantes com Fiemg e Camargo Corrêa


PÁGINA 20: Publicou na íntegra, com crédito de origem, o texto da Agência de Notícias do Acre. Confira:

- Investimentos estruturantes


A publicação de releases na íntegra não é ilegal. Na verdade é a medida correta a ser tomada, desde que fique bem claro que trata-se do posicionamento oficial de um órgão, público ou privado, acerca de algo. Esse é um dos motivos da importância do crédito de origem.

A questão fundamental aqui não é a publicação de releases. Um jornal, veículo necessariamente plural, deve mesmo abrigar todas as formas de textos e posicionamentos, pois é justamente daí que nasce o debate democrático.

A questão fundamental é mais sutil: é a transformação de um ângulo da notícia na notícia inteira, como se um release enviado por uma empresa ou órgão público pudesse dar conta da imensa e complexa gama de relações sociais, políticas e econômicas que produzem um fato qualquer...

Essa complexidade omitida torna-se dramática quando a imprensa passa a ignorar todo o clamor social em torno da IIRSA, onde a construção de hidrelétricas é mero preâmbulo de um experimento multinacional de neo-desenvolvimentismo na Amazônia - mesmo com toda a destruição e miséria produzida em todos os Estados na última tentativa, há quase 40 anos.

Muitos repórteres, fotógrafos e editores são filhos de seringueiros expulsos de suas terras ou tiveram que vendê-las a preço de banana depois que a chegada do "progresso" repetiu aqui o seu velho procedimento de mais de 300 anos: substituir relações econômicas familiares locais, regionais e até inter-regionais por enormes redes mundiais de transformação e circulação de matéria-prima por meio da mão-de-obra assalariada. Um monstro que não cessa de engolir trabalho e trabalhadores para produzir exclusão e concentração de renda em escala astronômica.

Como podem, então, esses jornalistas ignorarem o tão importante brado de protesto de povos indígenas, seringueiros, agricultores e camponeses?

A resposta está novamente na imensa rede de interesses que se escondem atrás de um modelo de imprensa "imparcial" que nada é senão a evidência da sua opção de ignorar a lógica do plural, do contraditório, de interesses que não sejam os do patronato.

E aqui surge a grande, a fundamental questão, cuja resposta deixarei ao seu critério: como poderá o jornalista evidenciar esse estado - multifacetado, contraditório, pluralizado - em relação às hidrelétricas se as empresas jornalísticas dependem do dinheiro dos financiadores do projeto?

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NOTA

Clique aqui ou aqui para baixar um estudo detalhado sobre a IIRSA e a hidrelétrica de Jirau. Se quiser maiores informações dos movimentos sociais sobre a IIRSA, consulte os sites da Rede Brasil e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

A foto foi escandalosamente chupinhada do blog Jornalismo Unip Tatuapé.