sexta-feira, 3 de setembro de 2010

VISÕES




Esses dias encontrei um amigo professor com quem não falava há muito tempo. Por eu estar acabando a faculdade – faço o curso de História – e estar um pouco (mentira, é muito) preocupado com minha situação trabalhista após o término do curso, conversamos sobre sua profissão. Por Vitor Augusto Ahagon


Ele me contou que está dando aulas em um colégio particular – que por sinal é muito caro – e acabou me revelando um pouco de sua angústia. Disse-me ele:

“As pessoas da classe média alta, por possuírem acesso fácil às informações, estão saturadas de tudo…Parece que, paradoxalmente, apesar de terem tudo estão vazias”.

Na mesma hora me vieram à cabeça dois filmes: “O Ovo da Serpente” de Igmar Bergman e “A Onda” de Dennis Gansel.

Pensei…

Apesar da generalização de meu amigo, a fala dele mostra uma situação um tanto interessante de ser avaliada. Bergman, em seu filme, nos mostra uma Alemanha totalmente destruída após sua derrota na primeira grande guerra. As personagens que são construídas ao longo da narrativa nos revelam a explosão de sentimentos que alemães realmente experenciaram. As crises econômicas, emocionais e existenciais devastaram o corpo e o espírito de homens e mulheres, fazendo emergir sentimentos de medo, angústia e desespero entre todos. O que estava em jogo nesta época era a falta de tudo, a privação de nossa vocação, a de sermos humanos, para tanto o que as personagens se tornaram foi nada. Esta situação gerou um nível de instabilidade tamanha que favoreceu a instauração do regime nazista. O nazismo entra para o poder político não como uma ideologia que aliena o povo, mas como uma ideologia que se aproveita da fragilidade do povo fazendo-lhe promessas de tempos melhores e de novas possibilidades. Não é à toa que Hitler é eleito democraticamente em 1933.

Já o filme “A Onda” nos coloca numa situação totalmente diferente. Mostra-nos adolescentes de um colégio da Alemanha que, aparentemente, não nos faz sentir a falta, mas o excesso. Estes jovens não estão passando por necessidades, não estão passando fome e nenhuma espécie de privação, mas algo é estranho. Até parece que o ter se perde no ser. Ter isso ou aquilo é ser isso ou aquilo. A estética aqui se revela como identidade, portanto, ora podem ser/ter anarquistas, ora podem ter/ser fascistas. O ter tudo, como é o caso desses adolescentes, é a condição de ser; e como se tem tudo acaba-se não sendo nada. Se tudo temos e nada somos, o que se gera, pelo menos no filme, é um amortecimento dos sentimentos; e, se nada se sente, nascem os comportamos mais diversos, como a indiferença, o individualismo, a desunião, etc. Tal situação é terreno fértil para florescerem as práticas fascistas.

Continua no Passa Palavra.

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