segunda-feira, 24 de maio de 2010

MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

Por muitas razões, fáceis de referir e de demonstrar, a história da imprensa é a própria história do desenvolvimento da sociedade capitalista. O controle dos meios de difusão de idéias e de informações - que se verifica ao longo do desenvolvimento da imprensa, como reflexo do desenvolvimento capitalista em que aquele está inserido - é uma luta em que aparecem organizações e pessoas da mais diversa situação social, cultural e política, correspondendo a diferenças de interesses e aspirações. Ao lado dessas diferenças, e correspondendo ainda à luta pelo referido controle, evolui a legislação reguladora da atividade da imprensa.


Mas há, ainda, um traço ostensivo, que comprova a estreita ligação entre o desenvolvimento da imprensa e o desenvolvimento da sociedade capitalista, aquele acompanhando a este numa ligação dialética e não simplesmente mecânica. A ligação dialética é facilmente perceptível pela constatação da influência que a difusão impressa exerce sobre o comportamento das massas e dos indivíduos. O traço consiste na tendência à unidade e à uniformidade. Em que pese tudo o que depende de barreiras nacionais, de barreiras linguísticas, de barreiras culturais - como a imprensa tem sido governada, em suas operações, pelas regras da ordem capitalista, particularmente em suas técnicas de produção e de circulação - tudo conduz à uniformidade, pela universalização de valores éticos e culturais, como pela padronização do comportamento.


As inovações técnicas, em busca da mais ampla divulgação, acompanham e influem na tendência à uniformidade. É interessante verificar o paralelismo entre o esforço técnico de produção, na imprensa, e o progresso dos meios de comunicação e de transporte, afetando o problema fundamental da grande imprensa, que é o do volume e espaço geográfico em que a notícia, ou a informação, ou a doutrinação têm oportunidade. O estreito vínculo entre a imprensa e a ordem capitalista aparece, também, na evolução do problema da liberdade de informar e de opinar. Assim, não devido ao rudimentarismo dos meios - que, na maioria dos casos, eram orais - carece de sentido recordar os sistemas de divulgação anteriores à invenção de Guttenberg e seu generalizado uso: a transmissão de notícias nas tribos primitivas, a Acta diurna dos romanos, o reaparecimento de seu processo em Veneza, nada têm a ver com a imprensa. Como todas as invenções, a de Guttenberg resultou de necessidade social, que o desenvolvimento histórico gerou e a que estava vinculada a ascensão burguesa, em seu prelúdio mercantilista. Como as trocas interessavam apenas a elementos de classes e camadas numericamente reduzidas, entretanto, o desenvolvimento da imprensa foi muito lento naquela fase, e ela foi facilmente controlada pela autoridade governamental.


Poderosas forças econômicas empenharam-se, desde então, por debilitar esse controle - eram as forças do capitalismo em ascensão: o princípio da liberdade de imprensa, antecipado na Inglaterra, vai ser encontrado, então, tanto na Revolução Francesa quanto no pensamento de Jefferson, que correspondia aos anseios da Revolução Americana, sintonizando com a pressão burguesa para transferir a imprensa à iniciativa privada, o que significava, evidentemente, a sua entrega ao capitalismo em ascensão. Nos países em que essa ascensão operava-se agora muito mais no plano político, pois estava já consolidada no plano econômico, a liberdade de imprensa encontrava barreiras nos remanescentes feudais, adrede mantidos, por vezes, pela própria burguesia, como escudos contra o avanço, embora ainda lento, do proletariado e do campesinato - a Inglaterra e a França particularmente - o problema permaneceu longamente no palco.


Foi a ausência, nos Estados Unidos, de passado feudal, que permitiu ali a solução rápida de tal problema, colocada a liberdade de imprensa - isto é, o seu controle pela burguesia - como postulado essencial e pacífico, abrindo-se ao seu desenvolvimento, então, às mais amplas perspectivas. Assim, enquanto na Inglaterra a stamp tax só desapareceu em 1855, e, na França, a liberdade de imprensa permaneceu relativa até 1881 - nos Estados Unidos surgiu ampla, praticamente, com a independência.


A corrida para a revolução nas técnicas de imprensa, iniciada na Inglaterra, quando o Times, em 1814, utilizou a máquina a vapor na sua impressão, seria ganha pelos Estados Unidos em pouco tempo. Era o ponto de partida para a produção em massa que permitia reduzir o custo e acelerava extraordinariamente a circulação. Era outra prova da interligação entre o desenvolvimento da imprensa e o desenvolvimento capitalista. O desenvolvimento das bases da produção em massa, de que a imprensa participou amplamente, acompanhou o surto demográfico da população ocidental e sua concentração urbana; paralelamente, a produção ascensional provocu a abertura de novos mercados, a necessidade de conquistá-los conferiu importância à propaganda, e o anúncio apareceu como traço ostensivo das ligações entre a imprensa e as demais formas de produção de mercadorias.


A ascensão capitalista, que a imprensa acompanhava passo a passo, como as suas mais significativas características, agravaria o contraste entre as áreas que se antecipavam naquela ascensão e as que se atrasavam; nas primeiras, era marcante a ascensão do padrão de vida e a divisão do trabalho se multiplicava, impondo a extensão da democracia política burguesa e o surto da educação, alargando extraordinariamente o público dos jornais e a clientela dos anunciantes; nas segundas, o quadro era inteiramente diverso. A luta pela rapidez e pela difusão, associando as alterações nas técnicas de impressão às que afetavam as comunicações e os transportes, modificou radicalmente o quadro em que a imprensa operava; nas primeiras áreas, isso ocorreu depressa; nas segundas, muito lentamente.


A luta pela rapidez exigiu da imprensa sucessivos inventos, conduzindo à velocidade na impressão, acompanhando o enorme e crescente fluxo de informações, devido ao telégrafo, ao cabo submarino e, depois, ao telefone e ao rádio. Em toda a área capitalista do mundo, essas transformações se alastraram rapidamente: nos Estados Unidos, na primeira metade do século XIX, Benjamin Day utilizaria um método já amplamente dominante na Inglaterra, ao desligar o seu jornal Sun da subordinação passiva e doutrinária aos agrupamentos partidários, para dar realce às notícias relacionadas com os processos judiciais e com os crimes, indo às fontes dos choques entre interesses individuais e ao fundo das paixões humanas, ao palco em que desembocavam, finalmente, as enxurradas da sociedade capitalista.


Day tornou, assim, em poucos meses, o Sun no jornal mais difundido nos Estados Unidos; em quatro anos, estava com a tiragem no nível dos 30 000 exemplares diários, tendo de dobrar o tamanho das páginas para poder acomodar os anúncios cujo afluxo crescia sempre. Era a diferença de formato, de pequeno, semelhante ao do livro, para grande, específico do jornal, um dos sinais da distinção que se estabelecia entre os dois processos de difusão de idéias. Foi esse, também, o caminho seguido, ali, pelo Morning Herald, em que James Gordon Bennet demonstraria a possibilidade de publicações de baixo preço para consumo em massa, outra distinção entre livro e jornal.


Contra o rush empreendido por homens como Day e Bennet seria inviável a resistência do jornalismo de cunho pesoal, cujo grande representante foi, nos Estados Unidos, Horace Greeley, quando o seu Tribune recusava o noticiário de crimes e de escândalos, optando pelo fervor editorial, pela predominância da opinião sobre a informação; a Guerra de Secessão provaria que esta interessava mais do que aquela, e exigia que aparecesse e se multiplicasse a ação dos correspondentes, deslocados junto ao teatro dos acontecimentos, como o Times, de Londres, fizera, quando da Guerra da Criméia. Logo a grande imprensa capitalista compreendeu, também, que é possível orientar a opinião pública através do fluxo de notícias; as associações especializadas em colhê-las, prepará-las e distribui-las facilitaram o trabalho dos jornais, quando o custo dos serviços telegráficos se tornou proibitivo para cada um, isoladamente, e conflitante com a necessidade de baixo preço unitário para a venda avulsa.


A partir do início da segunda metade do século XIX, o problema estava na luta entre essas agências de notícias que, adiante, seriam associadas aos monopólios industriais em ascensão, e terminariam concentrando-se, como aqueles. A luta entre a informação e a opinião não foi a única que marcou o desenvolvimento da imprensa; logo apareceu a luta entre a opinião e a publicidade, que era a forma organizada que a propaganda assumia. Já em 1803, o Evening Post confessava que "de fato é o anunciante quem paga o jornal ao subscritor", mas a realidade é que o anúncio tinha papel ainda secundário, sendo grande a resistência dos profissionais da imprensa ao seu avanço gráfico, que temiam como séria ameaça a valores éticos peculiares ao capitalismo de concorrência, e até estéticos, ligados à paginação, à arte gráfica, que, na verdade, estavam em liquidação.


É surpreendente que um inovador da visão de James Gordon Bennet tivesse lutado longamente no sentido de impedir que as colunas do Morning Herald fossem quebradas para acomodar largos anúncios, obrigando os anunciantes ao recurso de repetir a mesma sentença, em tipo pequeno e coluna única, ao longo de uma página inteira. A imprensa francesa foi pioneira no sentido de dar ao anúncio a apresentação gráfica destacada e, nos fins do século XIX, essa era a norma da imprensa por toda a parte em que alcançara desenvolvimento. A mudança seguinte foi no conteúdo do próprio anúncio: os velhos modelos de anúncios de estabelecimentos foram substituídos pelos novos, de mercadorias isoladas, valorizadas ao máximo pelas ilustrações, ganhando relevo quase artístico quando as cores foram introduzidas. Era a supremacia do fabricante sobre o comerciante; da produção sobre a circulação, peculiar ao capitalismo plenamente caracterizado e desenvolvido.


O extraordinário volume da publicidade comercial que afluía à imprensa tornou impossível o entendimento entre os produtores ou os comerciantes que operavam com as mercadorias anunciadas e os periódicos que as anunciavam. Surgiu o intermediário especializado, escritório ou agência, assumindo, em nossos dias, proporções de empresas gigantescas, encarregadas de organizar a publicidade para numerosos produtores e de distribui-la à imprensa. Essa divisão do trabalho concentrou nas agências de publicidade enorme poderio, ascendência natural sobre a imprensa: delas passou a depender a prosperidade dos jornais. Como as agências de notícias, especializadas em colher e distribuir informações, as agências de publicidade, especializadas em colher e distribuir anúncios, cedo se entrosaram na estrutura da economia de monopólio, gerada pelo desenvolvimento dapitalista nos fins do século XIX. Essas organizações fizeram da imprensa simples instrumento de suas finalidades: o desenvolvimento da imprensa, em função do desenvolvimento do capitalismo, as gerara; depois de servir à imprensa, serviram-se dela.


O segredo da imprensa consistia, à medida que o capitalismo avançava, na rapidez com que chegava aos leitores e na possibilidade de contá-los aos milhões. Era necessário, por isso, que a produção atendesse à multiplicação de exemplares, e que os transportes atendessem à distribuição oportuna, rápida, vertiginosa, dos exemplares velozmente multiplicados. As invenções que tornaram os periódiso empresas industriais aparelhadas, eficientes, capazes de produzir, todos os dias, milhões de jornais, seguiram-se umas às outras, a curtos intervalos. Nos Estados Unidos, a conversão da woodpulp em newsprint marcou essa evolução, caracterizada ainda pelo aparecimento da linotipo. Reproduzindo ilustrações rapidamente e a baixo custo, pela velocidade na impressão, nos fins do século, as novas máquinas faziam correr rolos de papel com a velocidade de um trem expresso, saindo os jornais em cores, quando era desejado, e sempre automaticamente contados e dobrados. Isso permitia enorme redução no custo da unidade fabricada, ao mesmo tempo que melhorava a sua qualidade.


Tudo conduzia, finalmente, ao rebaixamento do preço pago pelo leitor, em difusão cada vez mais numerosa, em influência cada vez mais larga, tudo em benefício dos anunciantes. Nos fins do século, nos Estados Unidos, Pulitzer podia oferecer o World a dois cents, reduzidos à metade na edição vespertina, com extensas ilustrações, numerosas faixas de historietas, grandes títulos, notícias sensacionais, enquanto Hearst, partindo da aquisição do decadente Morning Journal, construía o seu império na imprensa, proporcionando ao público inclusive uma guerra, a de Cuba. É fácil avaliar a terrível força de engrenagem que se compõe de agências de notícias, agências de publicidade e cadeias de jornais e revistas, sua influência política, sua capacidade de modificar a opinião, de criar e manter mitos ou de destruir esperanças e combater aspirações.


Quando se verifica que essa gigantesca engrenagem é simples parafuso de engrenagem maior, a que pertence, do capitalismo monopolista, ainda mais fácil é estimar o seu alcance e poder. Sem considerar esses dados, que a fria realidade apresenta, é impossível, entretanto, discutir problemas como o da liberdade de imprensa, aspecto parcial do problema da liberdade de pensamento. E quando são inseridas no quadro as novas técnicas de mobilização da opinião, como a televisão e o rádio, também submetidas, em muitos países, à iniciativa privada e associadas, inclusive, à imprensa, e também submetidas a organizações em cadeia, verifica-se quanto aquele problema fundamental se apresenta complexo e depende do regime predominante.



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